Tá na internet: “O nazismo não se explica sem psicanálise”, diziam Adorno e Horkheimer


O que muitos não gostam de pensar, por um real déficit e desprezo injusto pela psicanálise - que pensadores como Benjamin, Reich, Adorno, Marcuse, Sartre ou contemporaneamente Zizek. Laclau, Butler,  Mouffe ou Wendy Brown não tem - é que o fascismo é a atualização histórica, medida por elementos concretos da crise da época, econômica, social e técnica, de um fundamento psíquico elementar, arcaico, repetitivo, presente efetivamente em todo tipo de fascismo: a redução da linguagem à violência na política, a imantação e criação do grupo dos salvos e a invasão e a submissão de zonas de sonho, desejo e existência de um outro. 


A ativação destes elementos, seu reposicionamento significante político, define o fundamento de uma cultura política fascista, para o controle político forte de outros e modalidades históricas de extermínio. Fascismo é controle radical, e portanto sádico, de uma vítima criminalizada, ao mesmo tempo que radical desresponsabilização, suspensão de todo vínculo democrático, de alguma medida social amplamente comum de um espaço político includente.

Por saber desta conversão fundamental em uma ordem coletiva redesenhada de direito à violência, a política violenta do grupo reintegrado em seu território imaginário, psicanalistas viram com antecendência a onda neofascista no Brasil, e falavam sozinhos, enquanto muitos, ainda durante um bom tempo, não suportavam a evocação da palavra.

Confundiam o fascismo político, um princípio  subjetivante político, um modo de ser no mundo, produtor de poder, com a Itália fascista histórica... 

Aliás, este não suportar a forma do mal, e negá-la até o último segundo, como já foi anotado, também por Adorno e por Horkheimer, também é um efeito do fascismo. 

É algo psíquico não conseguir nomear e situar o terror político e de Estado, alguma paralisia diante do poder, como ele é. 

Um desejo, de que as coisas simplesmente não sejam assim - simétrico ao de que elas sejam assim, do grupo neofascista.

Qual é a vantagem de se pensar essa raiz fundamental, arcaíssima, de todo fascismo, que é o rebaixamento grupal da política à violência?

A vantagem é que, isto sendo real, e este é o ponto, precisamos encontrar modos históricos e humanos de chegar a interferir exatamente nesta esfera. 

E então, como todos os pensadores que citei acima, cada um em seu próprio registro, a psicanálise como método de rearticulação e transformação subjetiva, se torna elemento de política.

O que psicanalistas, mesmo com sua proverbial timidez pública, sempre disseram. 

O psicanalista Cristopher Bollas, que tem um texto importante sobre o “self fascista”, disse um dia que não é por acaso que a psicanálise surgiu no mesmo momento histórico da aparição das armas de destruição total em massas, é porque a humanidade teria que lidar mais seriamente e complexamente com a sua destrutividade e o seu ódio - e não existe nazismo sem formalização inconsciente... - sob o risco simples de se auto-exterminar.

Adorno e Horkheimer localizaram o fascismo como um fantasma negativizado, um duplo e uma sombra, que é o não dito sempre presente do próprio modo da razão ocidental colocar eu, epistemologia, prática, outro e natureza. 

O terror, que retorna pela porta dos fundos, de todo gesto de domínio racional ao modo, desencantamento e exploração, de si e do mundo. 

Como os antropólogos contemporâneos também pensam.

Foucault chegou a dizer que a esquizoanálise generalizada de Deleuze e Guatari era uma tentativa de alcançar o elemento fascista generalizado em nossas vidas, o insuperado núcleo fundante e repositor do poder como articulação de violência. 

As vidas, ao seu modo de entender, eram fascistas. 

São precisos princípios fundamentais de reconhecimento mais intensos e produção de práticas democráticas de circulação da palavra mais amplas para que o ódio seja reconhecido também em sua amplitude social, e relocado em sua função de estruturador da política. 

É preciso um fundo universal de democracia, que o capitalismo nega, e distorce permanentemente, para o reconhecimento da presença do fascismo comum, a personalidade autoritária comum, base de todo fascismo”.

Por: Tales Ab'Sáber.

Tá na internet.

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