Famílias de pequenos agricultores dos municípios de Pilão
Arcado, Remanso e Campo Alegre de Lourdes, no norte baiano, já estão criando
abelhas, de forma racional, para extração e comercialização de mel. A atividade
começou a ser incentivada pela Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São
Francisco e do Parnaíba (Codevasf) no âmbito das ações do eixo de inclusão
produtiva do Plano Brasil sem Miséria, implantado pelo governo federal em 2011,
e que são executadas pela Companhia em parceria com a Secretaria de
Desenvolvimento Regional do Ministério da Integração Nacional.
No município de Remanso, a 210 quilômetros de Juazeiro, 159
famílias de 27 comunidades rurais foram contempladas com as ações de apoio a
apicultura. O trabalho começou com uma capacitação que visou organizar a cadeia
produtiva, detalhar e qualificar o desenvolvimento da atividade e,
principalmente, acabar com o extrativismo rudimentar, que dizimava os enxames
para extração do mel.
Em Pilão Arcado são 38 comunidades rurais atendidas, nas
quais moram e trabalham 155 famílias de pequenos agricultores. Os trabalhos de
cadastramento, treinamento, entrega de kits para produção e acompanhamento
técnico começaram no ano passado nos três municípios, e em algumas comunidades
prosseguem até o final deste mês.
Já o município de Campo Alegre de Lourdes concentra o maior
número de comunidades atendidas – são 45 comunidades que reúnem 220 famílias,
todas elas selecionadas pelos critérios estabelecidos pelo Plano Brasil sem
Miséria, como também pela aptidão para a atividade apícola.
Segundo Everaldo Cavalcante, coordenador dos trabalhos na 6ª
Superintendência Regional da Codevasf, em Juazeiro, os benefícios dessa ação se
estendem a cerca de 2.100 pessoas nos três municípios.
Todas as localidades atendidas pela Codevasf recebem o
material necessário para o desenvolvimento da atividade. Foram implantadas até
agora 10.680 colmeias com suporte de ferro para fixação no campo, 10.680 quilos
de cera de abelha, divididas em placas já alveoladas, 1.068 indumentárias
completas, 534 formões, carretilhas e fumigadores.
Cada família passa a produzir mel com a utilização de cerca
de 20 colmeias completas, mais os equipamentos. O investimento é de
aproximadamente R$ 2,6 milhões, recursos oriundos do Plano Brasil sem Miséria –
conjunto de ações do governo federal voltado para a erradicação da pobreza
extrema e coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome
(MDS).
Os pequenos agricultores, que antes praticavam só a
agricultura de subsistência, foram selecionados por meio do cadastramento feito
dentro das exigências do Plano, entre elas a de estarem incluídas no Cadastro
Único para Programas Sociais (CadÚnico) e se encontrarem na linha de pobreza ou
extrema pobreza.
Economia.
Segundo estimativas de técnicos da Unidade Regional de
Desenvolvimento Territorial, da Gerência Regional de Revitalização da Codevasf
em Juazeiro, a produção em condições normais edafoclimáticas (relação entre
planta, solo e clima) é de 40 quilos de mel por colmeia ao ano, e o valor mínimo
do quilo de mel nos três municípios varia entre R$ 4,30 a R$ 5,60.
Espera-se que o trabalho realizado pela Codevasf incremente
a produção apícola nos três municípios em cerca de 427,2 toneladas de mel por
ano, e injete mais de R$ 1,8 milhão no comércio local de cada um desses
municípios.
Para Priscila Martinez, gerente regional de Revitalização,
“um item relevante em relação ao produto é que o custo de produção é de cerca
de R$ 1,50, o que proporciona aos apicultores familiares um lucro aproximado de
65% por quilo de mel produzido”.
O superintendente regional da Codevasf em Juazeiro, Alaôr
Grangeon, comenta que “com ações como essa, podemos proporcionar melhores
condições técnicas de trabalho para as famílias rurais beneficiadas, que
disporão de materiais e apetrechos adequados ao manejo apícola, e poderão
desenvolver melhor essa atividade, obtendo assim melhores resultados e
contribuindo para a sustentabilidade social, econômica e ambiental em suas
comunidades”.
Comercialização
Um dos municípios que possuem vocação para o desenvolvimento
da apicultura na região extremo norte da Bahia é Campo Alegre de Lourdes, a 840
quilômetros de Salvador. Há algum tempo a atividade era desenvolvida de forma
extrativista, através de “meleiros”, que retiravam o mel destruindo os enxames
nas matas.
Mesmo incipiente, a atividade fez surgir em outubro de 1996
a Cooperativa dos Apicultores de Campo Alegre de Lourdes (Coapical), que passou
a centralizar a coleta, beneficiamento e comercialização do produto.
Segundo o presidente da entidade, Clemente Duarte Mendes,
“atualmente a cooperativa possui 42 associados devidamente cadastrados, mas
existem mais de 100 produtores no município que utilizam os serviços da
cooperativa, e que ainda não se cadastraram”.
Para Jademiro Deveza da Silva, conselheiro da Coapical, “a
cooperativa exerce um papel importante no desenvolvimento socioeconômico da
região. Aqui temos um contrato com a Conab, e fornecemos sachês de mel a R$ 9 o
quilo para a merenda escolar”.
O tesoureiro da entidade, Gledson Pereira de Lacerda, fez as
contas e afirma que um balde com 25 quilos de mel pode variar entre R$ 145 a R$
170. “Este ano, de janeiro a março, já beneficiamos perto de 19.600 quilos de
mel, sendo que 10% deste total é de mel orgânico – que não contém produto
químico ou cujas colmeias não têm contato com áreas que utilizam químicos, como
lavouras”.
“No ano passado, arrecadamos perto de R$ 90 mil, e grande
parte desse total foi enviada para o sul do país, em tonéis de 280 kg”, afirma
Gledson. A cooperativa tem contrato de fornecimento com uma empresa paranaense
que exporta o produto para a Europa.
O mel de Campo Alegre de Lourdes é certificado por essa
empresa, que envia uma comissão de técnicos para verificarem a qualidade do
mel, orgânico ou não, e repassa aos produtores um código de identificação do
produto. Segundo o tesoureiro da Coapical, somente três produtores no país
conseguiram esta certificação.
Nova atividade
No período de janeiro a maio deste ano, segundo o técnico
agropecuário Moacir dos Santos Nunes, “algumas famílias conseguiram produzir 40
quilos de mel por colmeia, e vender até por R$ 6 o quilo de mel orgânico. Em
cinco meses foram contabilizados R$ 4,8 mil – o que, dividido por mês, chega a
uma renda de até R$ 960 para o produtor de mel orgânico”.
Pensando nesses resultados, em Campo Alegre de Lourdes a
retirada do mel já começou para algumas famílias. É o caso do pequeno
agricultor Salvador da Silva Lopes, de 35 anos, casado e pai de dois filhos, e
que já trabalhou por empreitada como meleiro.
Ele mora na comunidade de Barreiro do Espinheiro, e
participou com a esposa, Maria Gorete dos Santos Souza, de uma capacitação
sobre criação de abelhas para produção de mel, ministrada pela Codevasf. “Agora
eu estou trabalhando do jeito certo. Ganho eu e ganha a natureza também”,
afirma Salvador.
Ele afirma que não vai abandonar a pequena agricultura, e
que vai continuar plantando milho, feijão e criando alguns animais de pequeno
porte. “Mas eu já estou ganhando um dinheirinho, mais do que se eu estivesse
trabalhando na roça”, confidencia o apicultor.
Salvador já fez planos, e separou dois baldes de 25 quilos
para vender na Coapical. Nesta Páscoa, pela primeira vez o agricultor pôde dar
aos filhos um mimo que eles antes nunca tinham experimentado: um ovo de
chocolate.
Para o morador da comunidade de Sítio Novo do Pedrão,
Raimundo Rodrigues da Silva, de 40 anos, “aqui no Nordeste a gente sempre foi
educado para trabalhar na agricultura, mas depois do inverno, quando vamos tirar
os resultados, depois de muito trabalho, quase sempre não sobra nada. Mas agora
com a criação de abelhas nós vamos diminuir o trabalho pesado e ter um bom
resultado. Na verdade é a abelha que vai trabalhar pra gente, né?”, diz o novo
apicultor.