Eles nasceram para brilhar. Não foi por acaso que o destino os colocou ainda adolescentes sob a tutela de dona Edith do Prato, um dos maiores expoentes da arte e da cultura do Recôncavo. Daí que não foi surpresa para ninguém quando os irmãos assumiram o papel de destaque de uma das escolas mais tradicionais de Santo Amaro. Como balizas transformaram o desfile do Sete de Setembro em um verdadeiro espetáculo de ginástica, equilíbrio e contorcionismo.
Só foram de fato desafiados quando a escola adversária, sem alternativa diante do talento nato dos rapazes, cooptou artistas circenses para fazer frente aos “meninos endiabrados”.
E entre fatos e lendas os irmãos foram conquistando fama desde aquela época, lá no início dos anos 60. Que um nasceu em 29 de fevereiro e o outro, um ano depois, em 28 de fevereiro, é a mais pura verdade.
Que dona Edith do Prato não agüentou as peraltices e decidiu-se pelo internato é, digamos, meio lenda, meio verdade, afinal, os meninos precisavam estudar para serem alguém na vida e nada melhor do que dedicação em tempo integral para tanta energia, disposição e criatividade.
Não deu outra. Um virou artista dos palcos. O outro dos campos. Um corria, driblava e ditava o ritmo do jogo. O outro compunha, cantava e de posse do inseparável violão ditava o ritmo de canções que não se ouvem mais. Canções exuberantes diante da acachapante simplicidade dos versos.
Com o privilégio de desfrutar da amizade de Alberto e de Antonio durante muito tempo alimentei o desejo, compartilhado com ambos, de fazer uma reportagem sobre a vida deles, evidentemente misturando futebol e música. O roteiro é mais que óbvio.
A idéia central era mostrar a habilidade de Alberto com a bola nos pés, tendo como trilha sonora a música de raiz de Antonio. Cada um com seu instrumento de trabalho e prazer e ambos com um mesmo objetivo: alegrar as multidões.
Entretanto, por uma infinidade de motivos o fato é que a reportagem nunca saiu do papel. E para meu desconsolo e desatino na última quinta-feira a voz rouca e inconfundível do santo-amarense Leguelé Marques, o Antônio, irmão mais velho do craque Leguelé, eterno ídolo do Bahia, calou-se para sempre.
Fica um vazio enorme e uma certa culpa por não ter driblado as dificuldades e realizado a reportagem. Tenho certeza de que seria um registro definitivo sobre a força e o talento de dois homens, dois irmãos, que escreveram os nomes na história da música e do futebol.
Seja como for, fica aqui a sugestão de pauta para as redações de programas esportivos e culturais. Sim, o velho Lega nos deixou. Mas ainda dá tempo de fazer o resgate.
Leguelé, o craque, continua em plena forma, e Leguelé, o músico, deixou um legado de valor inestimável através de gravações que vão eternizá-lo na memória e nos corações de todos nós. Com tecnologia e edição tudo é possível. Até porque a Bahia merece que dois de seus filhos mais ilustres recebam esta justa homenagem. Antes tarde do que nunca.
Oscar Paris é Jornalista.