“Investigação sobre um cidadão acima de
qualquer suspeita”. Só os mais velhos e vocacionados para o
cinema-político deverão lembrar. É título versão de um filme italiano dirigido
por Elio Petri que estreou em escala
comercial no ano 1970. No filme, um inspetor do
alto escalão da polícia italiana com reputação ilibada, fama de incorruptível,
mas reacionário, mata sua amante, Augusta Terzi e procura induzir a polícia
italiana de sua autoria e todos os indícios por ele induzidos são afastados
pela própria polícia por entender ser ele um cidadão acima de qualquer
suspeita.
A expressão Investigação sobre cidadão acima de qualquer
suspeita é usada como linguagem satírica sobre o que se apresenta mais
não é, como aquele xampu que por décadas foi propagado na TV com o parece mais
não é, o que vale dizer, a pessoa se apresenta como uma coisa quando na verdade
é outra. Particularmente não chego a tal extremo sobre fatos recentes do
judiciário baiano.
No início da tarde de hoje ao acessar a Internet e abrir a página da barricada da cidadania jeremoabense, o blog dedemontalvao, odiado tenazmente
pelos corruptos e inescrupulosos com a coisa pública, para tomar conhecimento
dos desdobramentos da rejeição das contas de Tista de Deda e Pedrinho de João
Ferreira, pelo TCM-BA, fui remetido à matéria veiculada por Samuel Celestino,
sob o título “Tribunal de Justiça chega
ao fundo do poço” dando conta do afastamento de dois desembargadores do
TJBA, o atual presidente e a ex-presidente, pelo CNJ.
Na manhã de hoje, 05.11.2013, o Conselho Nacional de Justiça –CNJ- afastou das suas funções o presidente
do Tribunal de Justiça da Bahia, Des. Mario Hirs, e a ex-presidente
Desª. Telma Brito, resultado que
traz desconforto não somente para o Judiciário da Bahia, como também para toda
a comunidade jurídica baiana. A decisão foi de 11 X 4 votos.
O CNJ também determinou a
abertura de processo administrativo disciplinar – PAD - para apurar a acusação
de pagamento de precatórios na gestão atual e da desembargadora Telma Brito. O
fato teria gerado prejuízo estimado de R$ 448 milhões. Em um dos casos, o
acréscimo no valor de um precatório foi de R$ 176 milhões, outro de R$ 190
milhões. O que surpreende agora é que a
decisão do CNJ que ao determinar a instauração de Processo Administrativo
Disciplinar – PAD –, determinou o afastamento dos desembargadores dos seus
respectivos cargos, especialmente, o Des. Mario Hirs, atual presidente
da Corte Estadual de Justiça. A justificativa para os afastamentos se deveu:
“Em relação ao desembargador
Mário Hirs, impõem-se o afastamento porque encarna a representação do Poder
Judiciário da Bahia e também está investido dos deveres de gestão
e da condição de ordenador de despesa. A desembargadora Telma Britto
[ex-presidente] deve ser afastada cautelarmente da jurisdição para que a dignidade
da prestação jurisdicional seja preservada e a instrução processual ocorra
fluidamente”, afirmou o corregedor.
Com o afastamento, os
desembargadores continuarão percebendo
seus vencimento, ficando vedados de frequentar o TJBA e usar veículos da Corte,
entre outras mordomias.
Nos jornais televisivos da Globo,
Jornal Nacional, e da Bandeirantes, Jornal da Band, os afastamentos dos
magistrados foram manchetes e tudo isso não repercute bem.
Não se tratou agora da punição de magistrado interiorano do nordeste,
extremo sul, oeste ou do litoral. O CNJ bateu na cúpula do Judiciário Estadual.
No ano de 2012 um desembargador do TJBA foi jogado na compulsória por
supostos desvios de conduta. Agora são um ex e o atual presidente da Corte,
alcançados. Muito recentemente, um
advogado indicado pra compor o TJBA teve o nome sufragado pelo Tribunal e nomeado
pelo Governador e foi impedido de tomar posse pelo CNJ, cuja decisão foi
suspensa pelo STF que garantiu a posse do colega advogado.
Não me atrevo fazer juízo de valor sobre a conduta dos desembargadores
afastados. O que não se pode negar é que o TJBA ficou sob suspeita.
A Desª. Telma Brito, embora eu esteja sempre no Tribunal acompanhando
ações originárias ou recursos de meus clientes, nunca estive com ela quando
desembargadora. Conheci ainda criança em Jeremoabo quando o pai dela, Dr.
Cícero Britto, era ali Juiz de Direito na Comarca e posteriormente foi
Desembargador do Tribunal. O seu irmão Aliomar Silva Brito, de minha geração, é
também desembargador do TJBA e tem ela mais irmãos na magistratura. Com o
afastamento dela creio que os serventuários estão delirando. Segundo os
barnabés do judiciário, ela os perseguia.
O Des. Alberto Hirs não me lembro de ter mantido algum contato com ele no
exercício profissional. Pessoas a ele aproximadas dão o maior conceito. Em
relação a ambos, em visitas diversas, o CNJ questionou sobre processos
licitatórios e irregularidades no pagamento de precatórios. Quanto aos
precatórios, creio que possa haver erros de procedimento. Alguns juízes que
trabalham no setor são de reputação ilibada.
Quanto às licitações, diariamente tomamos conhecimentos de escândalos em
procedimentos licitatórios nas Prefeituras e na Esplanada de Brasília. No
judiciário nada se ouve, seja em Brasília-DF ou nos Estados. Creio que deveria se
fazer uma varredura nos dez últimos anos em todos os judiciários. No Brasil é o que não falta é justiça. É
justiça para todos os gostos e as instalações geralmente são suntuosas. Em
salvador foi construído de péssimo gosto o Sukitão, sede do TJBA.
Pela magnitude do terremoto imposto pelo CNJ ao Judiciário da Bahia as
consequências poderão ser imprevisíveis. Se a imagem não era boa piorou. Antes um desembargador caiu na compulsória.
Antes deste, houve tremores envolvendo nomes de desembargadores respeitáveis
cujas investigações não foram aprofundadas. Agora a batida é na cúpula.
Dir-se-á que no Brasil temos 03 justiças. A boa, a má, e a justiça
baiana. Outra premissa a percorrer os corredores das Cortes Superiores
em Brasília-DF é que em matéria de direito “qualquer besteira jurídica a
Bahia já tem precedente”. Recentemente um cliente sofreu um desses
terríveis precedentes da Corte e a matéria já em tramita em Brasília.
O Judiciário da Bahia padeceu sob a batuta do vice-rey ACM que ali
mandava e desmandava e nomeava os seus. Era um Corte extremamente servil e
subserviente, uma redundância. Uma justiça desqualificada moralmente,
ressalvados os bons juízes que exerciam a magistratura por vocação e com baixos
vencimentos.
Mesma cessada a influência de ACM, imposta aparentemente uma nova ordem,
pouco mudou.
O Judiciário baiano enfeitado por corregedorias de toda ordem, da
capital, interior, sempre foi incapaz de controlar a própria máquina, corrigir
os erros de forma antecipada, agilizar os serviços e controlar o pessoal. Os
servidores continuaram com baixos vencimentos e o processo de modernização vai
a passos de cágado. Há déficit de juízes. A falta de controle sobre os processos
e até sobre os magistrados é injustificáveis. Aqui são comuns os TQQ, juízes com origem em Estados
vizinhos que comparecem nas Comarcas dias de 3ª, 4ª e 5ª. Outra faceta é o
excesso de correições internas nas Comarcas e autorizadas pela CORGER,
repetidas várias vezes em cada ano que diferentemente do que deveria acontecer,
tem entravado mais ainda os serviços cartorários.
O que tem faltado é compromisso com a coisa pública.
O CNJ em diversas visitas feitas ao TJBA vinha reclamando que as
diretrizes do Conselho não estavam sendo cumpridas. Quando se acenou com a
possibilidade de instauração de procedimentos disciplinares contra os
desembargadores Mario Hirs
e Telma Brito diversos segmentos correram para prestar solidariedade,
entre eles, a OAB-BA que deveria exigir a apuração dos fatos, sem deixar de
colocar o princípio da presunção de inocência.
A situação atual impõe a todos uma reflexão. Mesmo com as dificuldades
temos encontrados no Judiciário da Bahia homens comprometimentos com a coisa
pública. Talvez a falta de estrutura do nosso judiciário desestimule os nossos
magistrados a um maior comprometimento. Mesmo sabendo como funciona o nosso
Judiciário, temos que acreditar e contribuir para o aperfeiçoamento da
instituição.
Recentemente, dois recursos em processos patrocinados por nosso
escritório, Montalvão Advogados
Associados, sem tráfico de influência, mesmo porque não temos, foram
julgados em menos de 20 dias por decisão monocrática do Desembargador
Relator. Outros estão levando em entre
120 e 180 dias, o que vale dizer, para melhorar o Judiciário da Bahia é preciso
compromisso com a coisa pública. Na Justiça estadual aqui em Paulo Afonso, pelo
que sei, já temos 03 juízes titulares e 01 designado ou substituto. Não sei ao
certo. Já é um grande avanço
Se a decisão do CNJ vai ser questionada pelos desembargadores afastados
no STF e se eles voltarão, eu não sei. Se restar em desfavor deles comprovação
de cometimento de infração disciplinar de natureza grave, que se puna. O que se
exige é o devido processo legal e que se assegure o amplo direito de defesa,
sem perder de vista do princípio da presunção, que todos são inocentes até
prova em contrário. O fato é que na
aldeia global a aparição do nome de qualquer pessoa na mídia, relacionado com
desvios de conduta já deixa um mácula difícil de ser retirada.
FRASE. “Não há tribunais, que bastem, para abrigar o direito, quando o dever
se ausenta da consciência dos magistrados." Rui Barbosa.
Paulo Afonso, 05 de novembro de 2013.
Fernando Montalvão.
Montalvão Advogados Associados.