O beijo de Nova Iorque que trouxe o mundo para Brasília

O aperto de mão e a conversa rápida no corredor da ONU foram mais do que cena diplomática, foram o ponto de partida de uma operação política costurada nos bastidores para reposicionar o Brasil no tabuleiro global, e para dar a Lula a narrativa de estadista que precisa no momento. Nos corredores, fontes próximas ao Itamaraty e ao gabinete presidencial descrevem um movimento planejado, Brasília não esperou apenas o encontro; provocou condições para que ele acontecesse com vantagem simbólica.

A articulação começou semanas antes, com interlocuções discretas entre assessores econômicos brasileiros e equipes técnicas americanas. A pauta era prática, comércio, clima e regras para investimentos, mas o desenho foi montado politicamente para que o presidente brasileiro aparecesse como quem oferece estabilidade e cooperação, não quem suplica por favores. Resultado, a aproximação virou espaço para o Planalto reafirmar prioridades industriais e a defesa do emprego, enquanto constrói tração internacional para medidas de mitigação de eventuais medidas protecionistas.

No centro da trama esteve o diálogo com governadores e empresários, alinhando mensagens para que a resposta brasileira fosse firme e articulada. O PT, longe de um mero observador, atuou como coordenador dessa frente social, garantindo que sindicatos e movimentos populares entrassem na narrativa pública, não como vitimização, mas como instrumento de pressão legítima por compensações e salvaguardas. Essa tática transformou tensão diplomática em oportunidade doméstica, Lula fala aos mercados e às ruas ao mesmo tempo.

Também houve jogo de cena, declarações calculadas, vazamentos seletivos e encontros com atores multilaterais que ajudaram a enquadrar qualquer ação americana como questão bilateral com risco de repercussão global. Assim, o Brasil não só ganhou visibilidade, mas também tempo para negociar tecnicamente medidas compensatórias, enquanto politicamente se apresentava como ator responsável e propositivo.

O risco existe, decisões abruptas de parceiros podem prejudicar exportadores em curto prazo, mas a estratégia é clara, converter pressão externa em agenda de fortalecimento industrial e diversificação de mercados. Na leitura do Palácio, essa postura reforça a imagem de Lula como articulador capaz de proteger empregos e construir soluções pragmáticas, um trunfo irrecusável em clima eleitoral.

O filme dos bastidores mostra, portanto, menos improviso e mais costura política. Quem puxou o fio foi uma coalizão de diplomacia, economia e movimentos sociais, comandada por um governo que aposta na gestão da crise como palco para demonstrar competência. Se o fio não arrebentar, a cena de Nova Iorque terá sido menos um acaso e mais o primeiro ato de uma nova fase brasileira no mundo.

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