SOBRE O PAPEL HISTÓRICO DO PT. (Por Breno Altman)

Até o surgimento do PT, nos anos 80, a esquerda brasileira não detinha protagonismo na vida política do país.

O PCB, principal partido da classe trabalhadora até então, operando como vértice do campo popular, não era alternativa de poder, em que pese sua poderosa influência na história nacional, ao menos desde a derrota da insurreição comandada por Prestes em 1935. 

Desde aquela época, e até o nascimento do PT, o embate fundamental era entre frações das classes dominantes, com os comunistas e demais forças de esquerda funcionando como elemento subordinado ou condenados (às vezes auto-condenados!) ao isolamento. 

Lembremos que o próprio trabalhismo não é uma criatura do movimento operário, mas produto de uma cisão nas oligarquias do país, comandada por Getúlio Vargas, ainda que tenha nascido em seu bojo, posteriormente, o nacionalismo revolucionário de Leonel Brizola. 

O esquema de alianças do PCB derivava, centralmente, da escolha de qual setor da burguesia poderia ser mais próximo aos interesses da classe trabalhadora, tratando de pressiona-lo e cativa-lo para assumir com mais consequência certas tarefas democráticas, populares e anti-imperialistas. 

O conceito de amplitude subordinava o de hegemonia: nas mais variadas táticas, à esquerda ou à direita, o centro estratégico elaborado pelo PCB (e herdado pelo PCdoB) não conferia um papel dirigente aos trabalhadores, em parte por conta de uma análise torta sobre o desenvolvimento do capitalismo brasileiro e a natureza da burguesia local. 

O PT rompeu essa lógica, mais por conta da potência do movimento operário que lhe dá origem do que por elaboração teórica. Lá se vão trinta anos nos quais a classe trabalhadora assumiu protagonismo, com a contradição fundamental passando a ser entre o campo popular e os partidos do grande capital. 

A propósito, grande parte dos erros cometidos pelo PT em seu período de governo teve como origem uma relativa abdicação do tema da hegemonia como princípio reitor da ação política. 

Com a derrocada do governo Dilma e a ofensiva reacionária, começam a surgir entre as correntes de esquerda, sempre em nome da correlação de forças, a opção de retorno à equação pré-PT, travestida de busca por um centro democrático desaparecido e por uma fantasiosa burguesia nacional ou dita "produtiva". 

Nesse raciocínio, novamente o conceito de hegemonia volta a se subordinar ao de amplitude, cujo significado não é outro que não a classe trabalhadora rebaixar seu próprio programa e amainar seu protagonismo, em nome de uma aliança que seja viável e realista, em tempos de recuo das forças progressistas. 

Essa é a essência, penso, de um dos debates fundamentais dos dias atuais. 

Admirável, nesse sentido, a coerência de Aldo Rebelo, ex-ministro e antigo dirigente do PCdoB, que rompeu com seu partido exatamente porque não acredita mais na hegemonia de classe, na verticalidade da questão operaria, substituindo-a por um difuso nacionalismo. Muitos pensam como ele, no PCdoB e no próprio PT, para não falar de outras organizações, mas não tem a mesma audácia revisora. 

O tema é complexo, embora de fácil enunciado: a reorganização da esquerda, obrigatória depois de tamanha derrota, passa por uma estratégia de hegemonia ou pelo retorno à velha política da aliança subordinada?


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