O ano era o de 1997, acho. Nunca fui bom de guardar datas,
tanto que em uma delas esqueci o meu aniversário, e quando voltei para casa à
noite, os amigos e amigas que não tinham ido embora, estavam dormindo espalhados
pela sala. Era uma festa de aniversário surpresa. Mas o assunto hoje não é
sobre isto, é sobre o convite que recebi da amiga Dóris Abreu para ir conhecer
Caetano Veloso em Salvador.
Ela, naquele ano, trabalhava com Gilberto Gil na Fundação Gregório de Matos na capital baiana. Dóris sabia que eu tinha toda a coleção de LP (Long Play) do Caetano e que gostava muito de suas canções. Ele é padrinho de um dos filhos dela com Tuzé de Abreu, que já foi seu músico do cantor. E foi por isso, que tive a oportunidade.
Recebi uma ligação e no outro dia eu já estava na estrada,
indo de Paulo Afonso a Salvador. Saí logo pela manhã e seis horas depois fui
direto à fundação onde a encontrei, e fui apresentado no corredor da
instituição a Gilberto Gil. Dóris fez uma ligação e recebeu a informação de que
Caetano estava na praia do Porto da Barra, mas que chegaria logo. Decidimos
esperar uma meia hora, e seguimos ao encontro.
Chegando à Avenida Adhemar de Barros, na casa em que Caetano
estava, e no muro estava escrito, “Caetano leu (nome o livro)” e embaixo alguém
escreveu, “e não gostou”. Aquilo foi um choque. Como uma pessoa poderia fazer
aquilo com um escritor?
Fomos recebidos na porta por Paula Lavigne e Caetano. Os
dois foram bem receptivos. Ele mostrou um óculos que teria comprado em uma
viagem ao Japão. Estava impressionado como a armação que se dobrava toda. Dóris
elogiou, e fomos convidados a entrar.
Tinha uma roda de conversa na varanda no fundo da
residência. Nela estava, entre outros, Waly Salomão, um dos poetas mais
brilhantes que já nasceu na Bahia e com seu vozeirão e sua risada, tomava conta
das conversas.
Pouco tempo depois de estarmos ali, calados e ouvindo, Dóris
chamou Caetano para autografar os discos. Ele no primeiro momento achou
interessante que alguém tivesse toda a coleção e tão bem conservada. Cada disco
estava dentro de um envelope plástico duro que conservava as capas e os
LPs.
Começou autografando o “Caetano” de 1968, seguiu no
“tropicália”, se deparou um pouco na capa de transa olhando antes de
autografar. Achou interessante eu também ter “Arara Azul”, disco experimental e
que eu gosto até hoje de ouvir. Teve um momento que ele disse, vou autografar
todos? E sorriu! Até hoje me culpo de não ter dito na hora, “escreva uma poesia
dividida em cada capa”.
Ao ver os dois LPs de “bicho”, o primeiro com ele, sua esposa à época, Dedé Gadelha e seu filho Moreno, nus na capa, disco foi proibido pela censura, e o outro, já sem eles na capa, Caetano riu.
Mas deixa-me dizer uma coisa que percebi naquele dia, nenhum
dos discos emocionou Caetano como o “Caetano”. Que ele está na capa de barba,
com um olhar triste e segurando algo do tipo casaco de pele. Ele parou uns
minutos, olhou a capa de um lado e do outro, me pareceu muito emocionado, é o
disco que ele mais gosta ou que lhe trás maiores recordações. Ao menos foi essa
a impressão que tive naquele dia.
Ele terminou de autografar todos os LPs, e Dóris já foi logo
chamando para sairmos. Já era noite. E foi assim que conheci, e tenho todos os
meus discos com a assinatura de um dos maiores cantores e compositores que este
país tem.
Eu nunca tive a oportunidade de agradecer a Dóris Abreu
publicamente por aquele dia. Hoje eu agradeço e digo que, aquele quadro com o
desenho de uma das figuras do disco bicho, feita por Caetano, ainda está na
minha lista de artigos a ser roubado de dela.
Relembrei essa história ao ver entrevista de Caetano ontem, 07, ao Cultura Inglesa.
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