É preciso estar atento e forte (I). (Por Roberto Bueno)


A vida política brasileira segue estacionada na encruzilhada em que foi colocada pelo golpismo inconsequente capaz de aliar marginais donos do capital a outros marginais possuidores de mandato político, ambos desinteressados completamente pela manutenção do Estado democrático de direito. O “impeachment Tabajara” foi liderado por Aécio Neves-Michel Temer-Romero Jucá-José Serra-Eliseu Padilha-Moreira Franco, etc. Foi este o grupo que conduziu o Brasil de uma crise econômica abordável sob a égide de um governo eleito democraticamente ao duro e completo esgotamento das estruturas representativas e das instituições políticas.
Fomos conduzidos até esta situação de forma absolutamente irresponsável pelo duo PMDB-PSDB sob a batuta de homens que seriamente se propõe matar a qualquer um que porventura delate os seus crimes (Aécio Neves) e a comprar o silêncio a peso de ouro de outros tantos para que não os delate (Michel Temer). É este o sistema de organização e administração pública para o qual nos conduziram Aécio-Temer sob o beneplácito imperdoável de velhas raposas da política como Sarney e Fernando Henrique Cardoso, homens que entrarão para a história por este seu gravíssimo papel de consentir que uma inescrupulosa quadrilha se fizesse com o poder sem denunciar os porões destas falsas vestais que conduziam o processo e que, no caso de Aécio, ainda mantém a qualidade de presidente doPSDB, hoje apenas afastado de suas funções.
Colocados por estes personagens em um beco sem saída, a vida política nacional hoje não concede alternativa para que Temer siga no poder, nenhuma, mas, sem embargo, faltam instituições e homens do tamanho do desafio que estes tempos impõe e que requer a retirada do golpista da cadeira que nunca deveria ter sequer estado ao seu alcance. Para homens da estirpe de Temer, a renúncia não é a alternativa, pois parece que lhe enche o coração de tédio mas ainda mais de medo ter de enfrentar as consequências de suas ações recheadas por acusações de crimes e ilícitos vários, exceto se ele puder receber algo em troca, única linguagem que parece entender, Porto de Santos que o diga.
A malandragem se espraia enquanto a pilantragem encontra nos desvãos togados a sua melhor proteção após viagens de avião transatlânticas, conferências-fake, conversas nos jardins à meia-tarde em passeios solitários, tudo isto temperado por tantas reuniões noturnas ao melhor estilo Joesley Batista. Os inquilinos do poder desejam manter as chaves do Palácio no bolso não por possuir algum projeto de nação, senão exclusivamente para manter as prerrogativas que o foro privilegiado oferece, e não há sequer um pingo de preocupação com os rumos imediatos (mediatos nem pensar) da nação. Múltiplas são as acusações que Temer precisa responder, dez mil crocodilos o esperam, famintos, neste breve interregno de dez metros quadrados de água que o separam do final de seu mandato. Não os cruzará, e logo a milionária conta bancária passará a ser controlada pelos familiares que permanecerão do lado de fora do presídio.
A hora de Temer já passou, e mesmo a prorrogação de seu tempo já se esgotou, envolvido que está em multiplicidade de ilícitos e crimes comuns, mas também de responsabilidade e caixa 2. Hoje Temer é uma espécie de Ali Babá sem os 40 ladrões, desfalcado de quase toda a sua equipe de conspiradores-golpistas dispostos a tudo em prol do enriquecimento. Um por um, foram ficando pelo caminho, começando pela queda de José Yunes (amigo fiel delatado na Lava Jato), Henrique Alves (preso), Rocha Loures (filmado correndo com mala repleta de dinheiro e, logo, preso), Eduardo Cunha (preso), Tadeu Filipelli (preso), Aécio Neves (prisão solicitada duas vezes), Sandro Mabel (denunciado), Romero Jucá (delatado na Lava Jato), Geddiel Vieira (denunciado), Lúcio Funaro (preso), Moreira Franco (denunciado), Andrea Neves (presa), etc., etc., etc. A cereja do bolo quadrilheiro é o próprio Temer, gravado diversas vezes e incluído como personagem de diversos ilícitos, sendo a última delas na delação premiada de Joesley Batista. Neste momento resta a pergunta sobre onde está aquele conjunto de briosos brasileiros e brasileiras vestidos de verde e amarelo que tanto pregaram nas ruas a moralização do país? Concordamos com isto, e agora, mais do que em qualquer momento, precisamos de sua sincera indignação, pois, como nunca, o momento é realmente grave, o país está sendo, agora sim, literalmente assaltado.
As grandes estruturas de poder que viabilizaram o presente estado de coisas não são de forma alguma inocentes e nem merecem perdão, pois, diga-se o que se queira, mas à uma poderosa empresa de comunicação como a Rede Globo o que nunca lhe falta é informação detalhada sobre todos os fatos da vida política nacional. A sua direção e também as maiores redações do país sempre souberam à perfeição quem era Temer e quais eram os seus negócios, assim como os de toda a quadrilha que assaltou o Estado.
Hoje, em meio a pior das tempestades, a Rede Globo abandonou o quadrilheiro e os irmãos das Gerais à sua exclusiva sorte. Não raro é mesmo assim que a marginalidade age, abandonando os seus quando caem em meio ao tiroteio e as dificuldades supõe a derrota. No mundo do crime não há espaço para qualquer nobreza, e até mandar matar está no script, não é mesmo sr. Neves? Todos estes homens tinham trajetória de práticas corruptas sobejamente conhecida, e deste seu “potencial” ninguém duvidava, e não foi por outro motivo que a grande banca e o mundo empresarial os elegeu para realizar o definitivo assalto ao Estado brasileiro, tarefa a eles encomendada em confiança de que perpetrariam obedientemente as supostas “reformas” para que a partir da aparência de legalidade o assalto aos trabalhadores pudesse justificar a aplicação da violência contra eventuais resistentes.
Malgrado a abundância de provas que salta por todos os lados, Temer mantém modesta base de apoio em diversas esferas, na imprensa inclusive, notadamente Reinaldo Azevedo, admirador de Gilmar Mendes, mas também nos outros dois poderes. Os seus apoiadores insistem em clamar por mais provas contra Temer, e as vozes das aves plumosas que ainda se alçam para acobertar o crime institucionalizado pretendem que outras delações – como a de Rocha Loures – sejam feitas para, somente então, retirar apoio ao Governo. Mas baseado em que precisaríamos da delação de homens como Rocha Loures quando o próprio Temer já confessou seus crimes na gravação noturna feita na garagem do Jaburu pelo delator Joesley Batista? Reiteremos: O próprio Temer já produziu provas definitivas contra si. Que outra delação ainda querem as vestais já desnudas pregadoras da moralidade política?
Neste autêntico circo de horrores sem qualquer alegria assistimos nesta semana passada mais um movimento do comprometido Poder Judiciário brasileiro, que deu mais uma patética mostra do que muitos de seus membros são incrivelmente capazes de fazer. As imagens da sessão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que evitou a queda de Temer dão o testemunho e a dimensão exata do temor que qualquer daqueles homens possa julgar as altas causas que envolvam os interesses da nação. Uma de nossas mais altas cortes está composta por homens cujo comportamento inspira na audiência qualquer estágio intermediário entre o embasbacador, o trágico e o sinistro. O espetáculo patrocinado pelos ministros do TSE foi nada menos do que patético, com direito, inclusive, a dedo de ministro colocado em paralelo ao seu pescoço e em movimento, insinuando ameaçadoramente cortar a garganta de seus desafetos.
Não poderia faltar nas atividades mambembes a manifestação oratório-política falseada de juridicidade do ministro Gilmar Mendes, capaz de interromper a fala do ministro Herman Benjamin para reclamar para si todos os méritos daquela ação, mandando às favas a modéstia (literalmente!), única condição para que Benjamin estivesse ali a brilhar em rede nacional de televisão. A ação contra a então presidente Dilma Rousseff começou pela vontade de Gilmar Mendes, muito embora a recente gravação de contato telefônico seu com Aécio possa levar a suspeitar de que se tratou naquele momento passado de alimentar o capricho do ex-político conhecido pela alcunha de “mineirinho”, também flagrado em gravação telefônica dizendo que tinha impetrado a ação para “incomodar o PT”. Este era o tamanho real do candidato à Presidência Aécio Neves tão próximo de Mendes, que no desfecho da ação proposta por Aécio, e como lhe interessasse manter Temer no poder, não hesitou em localizar algum argumento jurídico qualquer para colocar a pá de cal sobre a ação que alimentara.
As figuras-chave que patrocinaram o golpe de Estado contra a expressa vontade das urnas em favor de Dilma Rousseff em 2014 estão hoje, todas elas, sem exceção, colocadas em xeque, todas elas envolvidas diretamente em casos de corrupção, presas, denunciadas, pegas com contas na Suíça ou outros países. Dilma não, e nem Lula. Reverter o quadro é possível, mas sem a ancoragem na ação popular apenas transitaremos de uma grave crise como a presente para uma outra talvez menos intensa apenas por estar mascarada. As ruas necessitam de todos (as). As urnas repletas do sentido de vontade democrático-popular tampouco serão suficientes para que um novo e legítimo governo que emergirá do processo eleitoral tenha força suficiente para desconstruir o golpe ora em curso e reinaugure o projeto democrático-social. Será necessário muito mais, que à presença maciça nas urnas se some o ativismo político constante para legitimar as duras medidas de retomada da radicalização democrática que os novos tempos requererão. Em face às resistências conservadoras, diria o cancioneiro popular que “É preciso estar atento e forte / Não temos tempo de temer a morte”. (segue).

Nenhum comentário: