Quando a minha família deixou a região da Praça Libanesa em Paulo Afonso na Bahia, lá pelos anos 70, e veio morar no que se tornaria a Rua Duque de Caxias, onde moro até hoje, no inicio eu me sentia muito perdido. Além da casa que meu pai e minha mãe construíram, aqui tinham outras poucas. Sobrava mesmo era muito mato. A coisa era tão precária que não tínhamos água encanada em nossa residência. E isto durou por muito tempo.
No cruzamento, da Rua Alto
Novo com a Manoel Novaes, lá ficava um chafariz, e era de lá que por muitos nos
a minha mãe ia buscar água para o nosso consumo. Ela pegava duas latas grandes, cada uma com uma
corda e amarrava na ponta de uma madeira. Muitas foram às vezes que a
acompanhei nesta caminhada que devia ter uns quatrocentos metros.
Para mim era uma diversão
tudo aqui. Mas hoje, ao lembrar do rosto que minha mãe fazia quando vinha
subindo a Manoel Novaes, percebo o quanto de dor ela sentia com aquele peso em
suas costas. Um dia ela mostrou o ombro esquerdo todo inchado e vermelho. Eu na
minha inocência de criança via aquilo como algo bom. Para mim, aquela dor não
existia, era só uma imagem.
Quando criança nós não
percebemos os esforços que nossos pais fazem para nos criar. Tudo é motivo de
festa, de rizadas de cobranças. Mas na verdade, quando nos tornamos adultos é
que começamos a perceber cada ato, cada imagem registrada em nossa memoria o
quanto eles foram e são importantes em nossas vidas.
Eu perturbava tanto a minha
mãe para ter algo igual ao que ela carregava nas costas buscando água no
chafariz que, foi o meu pai quem improvisou uma solução para o caso. Ele pegou
duas latas de leito em pó e fez o meu instrumento de trabalho. Amarrou em um
cabo de vassoura e realizou o meu sonho. Eu também podia ir com minha mãe
buscar água.
E foi assim que durante
muito tempo, quando a minha mãe ou o meu pai iam ao chafariz, eu pegava as
minhas latas e ia junto. O danado da coisa é que, eu não conseguia manter as
latas niveladas para não derrubar a água. Elas balançavam tanto que quando chegávamos
em casa, quando muito tinham era a metade do que eu conseguia colocar na saída.
E mesmo assim para mim era como se todo o trabalho realizado fosse tão
importante quanto o que eles faziam. Coisas de criança, claro.
Ainda hoje, quando passo
pelo cruzamento, algumas vezes eu relembro do chafariz, onde tomava banho com
os meus irmãos e de onde buscávamos água para saciar a nossa sede. O local hoje
está asfaltando. Essa praga que infestou as ruas da cidade e que transformou Paulo
Afonso em um micro-ondas. As ruas antes pavimentadas com paralelepípedos foram
cobertas com o revestimento de betume. Tudo em nome do “progresso”. Preferiram
preservar os carros em detrimento do ser humano.
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