Lula: Cartas da prisão


Segundo o ex-ministro Zé Dirceu, “existe uma depressão pós-visita que é uma coisa séria”, para quem está na prisão. Ele descreve isto em seu livro"Zé Dirceu: Memórias - Volume 1", lançado no ano passado. Já em Memorias do Cárcere, Graciliano Ramos fala dos anos que passou encarcerado no período do primeiro governo de Getúlio Vargas. Preso na capital alagoana em março de 1936, acusado de ser militante comunista, foi enviado a cidade de Recife. De lá foi transferido para o Rio de Janeiro no navio "Manaus". Só obtendo a sua liberdade em janeiro de 1937. Durante esse tempo, esteve no Pavilhão dos Primários da Casa de Detenção, na Colônia Correcional de Dois Rios (na Ilha Grande), voltou à Casa de Detenção e por fim, pela Sala da Capela de Correção.

Livre, Graciliano escreve sobre tudo o que viu e passou na prisão. Essas memorias mostraram uma pessoa amargurada, triste e impotente. Como não havia acusação formal, sua estadia se dava arbitrariamente. Mas foram essas revelações em livros que mostrou ao mundo como uma ditadura pode ser cruel e não escolhe classe social. Escolhe pessoas.

Lula escolheu a carta, para se corresponder como um mundo aqui fora. Ele vem escrevendo de próprio punho, textos agradecendo apoios, conclamando a militância para a luta e indicando o caminho a ser seguido. Da prisão, o ex-presidente ainda é o político mais temido por seus opositores e por aqueles que sonham ocupar o seu lugar de liderança. Ledo engano os que se apressam tentando mudar o rumo da história.

Aos BRICS, grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, ele fala da criação da aliança, “quinze anos atrás, o mundo vivia um momento de intenso diálogo e inovação nas relações entre os países. Apesar das guerras e da fome que atingia mais de 1 bilhão de pessoas, inclusive no Brasil, víamos nascer novas iniciativas de diálogo em torno de uma agenda global”. E profetiza (palavra da moda), “vejo com muita esperança que podemos continuar contribuindo por meio do diálogo entre nossos partidos políticos, o que é uma honra”.

Para Haddad, já no período eleitoral, uma das cartas dizia, “Será necessário trabalhar dia e noite, dialogar com a sociedade, saber ouvir e saber agir”. Ele enviou um dia após anunciar estar desistindo de sua candidatura a presidência da república. No aniversário de 71 anos de idade, a ex-presidenta Dilma Roussef, recebeu uma carta. Nela há um pedido. “Querida Dilma, estou te escrevendo para te dar os Parabéns por mais um aniversário, que você tenha força para resistir, atacando e não se defendendo”. O recado de Lula é direto contra aqueles que deram o golpe. Acusada sem provas, ela foi arrancada do poder por aqueles que deveriam defender a constituição, “com STF, com tudo”.

No Natal de 2018, a militância também recebeu a sua carta. “Esse Natal não poderei estar junto fisicamente com a minha família, meus filhos e netos. Mas não estou sozinho. Estou com vocês da vigília, que tem sido minha família, e com todos aqueles que vieram passar esse Natal junto de vocês”. Lido para aqueles que participam da vigília Lula Livre, que desde o primeiro dia do encarceramento político do ex-presidente, estão na frente da sede da polícia federal em Curitiba no estado do Paraná. Ao MST – Movimento dos Trabalhadores Sem Terras, ele diz que “os dias difíceis nos fazem redobrar nossas forças”. É o recado para que mesmo sofrendo tamanha injustiça, mesmo estando privado de sua liberdade, a luta não cessa. Tem que ser diária, sem interrupção, até que se restabeleça a verdade e a liberdade possa vir para todos aqueles que sofrem injustiça.

Nos últimos dias, antes mesmo de anunciar a sua desistência do mandado parlamentar, Jean Willys, recebeu mais uma carta vinda da prisão. “Eu estou convencido que temos que consolidar um forte enfrentamento político com o governo, e ao mesmo tempo, tratar de organizar politicamente o nosso povo”, disse Lula. Ele agradecia o presente que recebeu do deputado. O livro "Tempo bom, tempo ruim". “Querido Lula, eu te amo, mesmo, você está livre em mim e em milhões de brasileiros. Sem você, não seríamos o que somos. Atravessaremos esse tempo ruim, e, quando vier de novo o tempo bom, dar-te-ei um abraço livre!" Jean Wyllys.

No dia 16 do janeiro, o presidente da Argentina, Mauricio Macri, esteve em Brasília. Naquela oportunidade, Rodrigo Pilha, da fanpage Botando Pilha na rede social Facebook e o Fabiano Trompetista, azucrinaram o evento. Eles ficaram a alguns metros do local e de lá tocaram várias músicas. Foi o bastante para os policiais tentarem intimidar a manifestação dos dois. O que não aconteceu. Enquanto pediam documentos, o som era executado todas as vezes que Bolsonaro ou alguém da sua equipe de ministros eram vistos. Ao final, os militantes foram levados à delegacia. Na pressa o musico esqueceu a sua identidade. Após comprovar sua idoneidade foram liberados e já participaram de outras ações. Provavelmente você já ouviu o som de “Lula Livre” sendo tocado em algum link ao vivo da rede Globo. A preferida deles.

Ao saber do acontecido na cadeia em Curitiba. Lula enviou uma carta. “Queridos Fabiano e Pilha. Soube dos acontecimentos em Brasília. Eles precisam aprender que a democracia não é um pacto de silêncio, mas sim, uma sociedade em movimento em busca de liberdade. Que toquem os trompetistas do Brasil inteiro para acorda-los para a liberdade”.

Lula está isolado na prisão. Só seus advogados, barbeiro e pessoas da família estão autorizados a estar com ele. Mas de lá daquele ambiente triste ele mostra força para manter mobilizado o Partido dos Trabalhadores, a militância de esquerda e até seus opositores que vivem a sombra do maior líder da esquerda no mundo. Eles precisam de Lula para existir.

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