MAIS QUE COERÊNCIA, DISCIPLINA. (Por Francisco Costa.)

Talvez por ter começado a militar quase adolescente, numa sanguinária ditadura, e num partido clandestino, envolvido com a luta armada, criei e desenvolvi alguns valores que parecem ter perdido a importância, nessa suruba tupiniquim, de muitos palpites e poucas opiniões, de muita “prática” e nenhuma teoria, criando o que Marx chamaria de bagunça e indisciplina.
O maior deles foi o do centralismo democrático, coluna onde se apóia toda a estrutura de um partido.
No centralismo democrático os votos perdedores se submetem aos votos vencedores, majoritários, e isso é democracia.
Insurgência contra a vontade da maioria é golpe ou tentativa de golpe, traição ao partido e aos companheiros.
A direção do Partido dos Trabalhadores fez a opção: diretas.
Os principais nomes do partido, mais que majoritariamente, em uníssono, por consenso, seguiram a linha do partido: diretas.
A posição oficial do partido é pelas diretas.
Pesquisa realizada pelo Instituto Datafolha apontou que 90,6% do povo brasileiro querem diretas.
Ora, o que justificaria a insistência em defender outras bandeiras senão o oportunismo de uns, a pouca ou nenhuma politização de outros, de quase todos, a vaidade, o culto a personalidades, a marcação de posição ou qualquer coisa semelhante?
Se o partido não atende mais aos anseios do militante, não corresponde mais aos anseios do militante, não trilha mais o caminho que o militante esperava que trilhasse, é porque chegou a hora do militante buscar outro ninho, mais afim com as suas pretensões, sem a veleidade de achar que pode direcionar um partido.
O que não agüento mais e ver uma minoria barulhenta e radical ficar citando PCO dentro do PT, dando pancadas em Lula (já chegaram a ponto de me chamar de lulo-petista, acreditando que isso é uma ofensa, ou que eu me sentiria ofendido), desqualificando Boulos, Stédile, batendo em Haddad ou alegando machismo o não apoio ao retorno da Dilma, o que fere princípios elementares do feminismo, basta ter alguma leitura.
Ora, se Dilma fez a opção pelas diretas, pedir Anula STF ou Volta Dilma é, mais que fazer oposição ao partido, é fazer oposição a ela, e aí, para justificar, vêm as intuições dallagnolianas, sem respaldo ou provas: ela foi forçada pela direção do partido a tomar essa posição, ela não está satisfeita com a opção pelas diretas... Como se Dilma não tivesse a forte personalidade que tem, ou se valem de afirmações e iniciativas dela em outra conjuntura, trazendo para agora, automaticamente, por transplante puro e simples.
Alguns companheiros vêm se mostrando irritados com esse meu embate quase solitário com esse grupo.
Sei o ônus que estou pagando, e também sei do bônus, e posso afirmar com certeza: o meu saldo é positivo, tanto que foi deliberação do grupo não me contestar mais, o que de fato está acontecendo, exceto por um ou outro mais desligado.
Outros companheiros criticam as minhas provocações ao grupo, acreditando serem gratuitas.
Provocações sim, gratuitas, de maneira alguma. Não faço nada impensadamente, a provocação tem uma razão de ser.
Um fato ocorrido no século passado, em plena ditadura, bem diz do meu posicionamento: reunião da Sociedade Brasileira Para o Progresso da Ciência – SBPC, no Rio de Janeiro.
Debate da ala progressista da Igreja conosco, da esquerda considerada radical, a dos “subversivos”, “comunistas”, “terroristas”, na boca dos generais e da mídia, na concha acústica da UERJ.
Presente a fina flor da resistência religiosa: Boff, Frei Beto, Dom Waldir Calheiros, Dom Pedro Casaldáliga... Não lembro se Dom Evaristo Arns estava e Dom Hélder não foi, tinha outros compromissos.
Em determinado momento tomaram uma prensa da pequena platéia (houve ameaças, antes, o que afastou muita gente): porque a Igreja não se abria para as mulheres, não assumia oficialmente a Teologia da Libertação, acabava com o celibato... E todos vieram com justificativas, conosco notando que ficaram em posição incômoda: a maioria deles concordava conosco, mas se submetia à disciplina clerical, até que Frei Beto sintetizou tudo:
- É o preço que temos que pagar. De concessão em concessão a instituição acaba. 
Grande lição, palavras exatas.
Já comentei, em outros artigos, que fui feroz opositor do PT, quando dirigia um dos maiores e mais influentes sindicatos do país, na época, e porque isso?
O PT era uma frente que mais parecia um aglomerado anarco-sindicalista, com correntes, tendências, grupos... Alguns deles visceralmente inimigos, o que me obrigava a negociar em separado, com um por um (a situação era tão surreal, que cheguei a esconder de uma tendência a posição da outra, sobre determinado ponto de pauta, numa negociação com o patronato, porque o simples fato de que, ainda que boa, qualquer proposta defendida por um era recusada por outro, só para marcar posição. Cheguei a mediar conflitos dentro do PT, sem pertencer ao partido, para a luta sindical caminhar).
Isto atrasou em muito o crescimento e a afirmação do partido, que só se afirmou e elegeu Lula presidente quando estrategistas inteligentes, muito inteligentes, entre eles José Dirceu, depuraram o partido, isolando os radicalismos, dando-lhe unidade.
Não se trata dos militantes virarem vaquinhas de presépio ou rebanho passivo. 
Na última convenção, por exemplo, tivemos os que defenderam Gleise e os que defenderam Lindbergh para a presidência; os que defenderam a aproximação com os golpistas, se Temer continuar, e os que defenderam o isolamento dos golpistas; os que defenderam a participação do partido, se houver indiretas, e os que defenderam a abstenção; os que defenderam o volta Dilma e os que defenderam as diretas... Em discussões muitas das vezes acaloradas, mas isto numa convenção, dentro do partido, e não por insurgência, publicamente, municiando adversários políticos e inimigos de classe.
Não estou petista por ser fã, tiete ou admirador de Lula ou Dilma, embora a minha admiração pelos dois não possa ser medida. 
Acredito que críticas a nomes e comportamentos não só são úteis como necessários (meus seguidores mais atentos já leram críticas minhas a Lula e Dilma, por determinadas iniciativas tomadas ou deixadas de tomar), o que está longe das críticas ao partido como um todo ou da tentativa de desconstruir lideranças.
Estou petista por questão ideológica, por ver no partido o instrumento melhor adequado e melhor aparelhado para promover as mudanças sociais que o país e o povo precisam e reclamam, e para isso é preciso que seja forte e unido, coeso.
Sempre que eu farejar qualquer possibilidade de divisão, fracionamento, enfraquecimento, combaterei, ainda que a posição dos dissidentes seja a minha, porque a unidade é mais importante, bem de acordo com o dito por Frei Beto:
- De concessão em concessão a instituição acaba.

Por Francisco Costa.

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