Correu logo pela manhã daquele dia fatídico a informação de que mataram Zé Grandão. Encontraram seu corpo estendido no chão. O homem era bem afeiçoado e chamava muito bem a atenção de todos que o conhecia. Ele tinha uma preferência em fazer amizade com as mulheres. Bom de papo e contador de conversa tinha sempre alguém para escutá-lo.
Por essas e outras que
Grandão recebia de sua esposa sempre o mesmo conselho.
- Zé tu tenhas cuidado com
essa amizade com tantas mulheres, tu vai ficar mal falado e os maridos podem
não gostar disso.
Mas ele sempre respondia.
- Mulé, deixa de ciúmes. Tu
sabe que não tenho nada com ninguém além de tu. Tu é o amor da minha vida,
primeira e única.
E era assim que aquele
moreno com a pele curtida pelo sol do nordeste vivia a vida, como se não
houvesse o amanhã. Para ele, descarregar uma carrada de tijolos, tirar manga e
carregar água do chafariz para as casas das amigas, era tudo por amizade.
Todos os anos Zé Grandão era
chamado por uma mulher da vizinhança para ser padrinho de algum rebento. Os
familiares não entendiam aquela predileção, já que o Cabra não tinha um tostão para
ajudar nos batizados ou para dar um presente que fosse. Imagina bancar o almoço
do dia da festa do batismo. Ninguém contasse com ele para um gasto. Mesmo
assim, era quase sempre o escolhido.
Mas parece que algo deu
errado na vida do Zé. É que Mané viajou para trabalhar no Iraque e por lá
passou mais de um ano e só depois pôde retornar e Zefinha, sua esposa, o
recebeu com um barrigão que já tinha estourado todas as calças que usava. Foi
preciso fazer algumas nesgas para ela poder vestir.
Mané estava muito feliz, ele
iria ser pai pela primeira vez e isto foi motivo de festa na rua. Ele gastou
boa parte do dinheiro que tinha ganhado, mas tudo aquilo foi para comemorar a
sua felicidade, e também a da mulher. Diferente da felicidade dele, não se via
um sorriso nos lábios dela.
No dia da festa, tava lá Zé
Grandão, alegre e falador como sempre. Comeu, bebeu e se fartou. Passou boa
parte do dia dando bênçãos aos afilhados e sorrindo para as amigas. Elas
sorriam com um riso amarelo e muitas encaravam Zefinha como se soubessem de
algo não contado ainda.
Teria ela mais um segredo e
guardar naquela comunidade?
Depois de seis meses a Zefinha
deu a luz a um menino. A notícia circulou como rastilho de pólvora. Seria um
fenômeno da medicina, uma criança com poucos meses de gestação vir à luz. Mané
estava muito satisfeito com tudo aquilo acontecendo em sua vida, já a mulher
não parecia muito empolgada com a situação.
No retorno para casa da
criança e sua mãe, os amigos e amigas iam sempre tomar o “Cachimbo” e ganhavam
uma lembrancinha. Passou tanta gente naquele domingo pela casa que ficou
impossível saber quantos estiveram por lá. Todos cumprimentavam Mané com
euforia, tomavam uma dose de licor, beijavam a criança e ficavam algum tempo na
conversa.
Do meio dia para a tarde. O
humor de Mané mudou como da água para o vinho e ele começou a olhar diferente
para a esposa. Se achegou perto da cama, olhou para o berço onde estava o bebê,
pegou nos braços e o beijou com carinho. Levou o resto do dia sem dar mais um
sorriso, mesmo assim, recebeu os que lá foram. Tudo depois que aquela jovem
falou com ele no canto da sala.
A noite, cansados, foram
todos dormir, pois já era chagada a hora.
Pela manhã correu a notícia
da morte de Zé Grandão. Foi encontrado no Beco do Cuscuz com um tiro na nuca.
Ninguém ouviu um barulho que fosse. Ninguém sabe quem fez aquela desgraça com
um homem de coração tão enorme. Nenhuma pista foi encontrada, nada até o
momento indica quem teria tirado a vida dele.
A polícia demorou a chegar,
cobriram seu corpo com um lençol branco que logo ficou pintado de vermelho.
Pela vizinhança se ouvia o som de choro nas casas ao redor. A morte de Zé
Grandão comoveu muita gente, principalmente as suas amigas. Até muito mais que
sua esposa que, parada ao lado do corpo, não tirava os olhos dele sem derramar
uma única lagrima. Dizem que ela estava em choque e que essas coisas acontecem.
Marcaram o enterro para à
tarde do mesmo dia de sua morte. Durante o velório muitas mulheres apareceram
para se despedir. Contaram pra mais de 15, todas elas vestidas de preto em luto
fechado. Algumas arrastavam filhos pelos braços e se debruçaram no caixão. Uma
cena que emocionou a todos que viram aquelas imagens. Suas amigas não o
abandonaram nem no seu leito de morte.
Deram falta de Cristina,
aquela novata formosa que fazia pouco tempo estava morando na mesma rua que o
Zé. Souberam depois que ela foi embora ao meio do dia. Mandou avisar que não
suportaria ver aquele corpo dentro de um caixão, tamanha era a sua amizade por
Zé Grandão. Quem lhe deu carona para pegar o ônibus que iria para São Paulo foi
Mané o esposo de Zefinha e pai do último menino que nasceu. Ele a levou até a
rodoviária e lá a deixou. Não antes de lhe dar um abraço e dar uma ajuda para
ela não passar dificuldades na estrada. Ela chorava, ele de cara amarrada.
Assim foram vistos os dois na despedida.
Mané era muito amigo de Zé
Grandão e assim como a esposa do defunto, não derramou uma gota de lágrima
sobre o caixão. Não demorou muito e ele arrumou outro trabalho, agora pras
bandas do Pará e dizem que de lá nunca mais mandou notícias.
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