ESPECIAL ROYALTIES: ENTREVISTA DE LUIZ RUBENS FERREIRA DE ALCÂNTARA BONFIM.


Para falar sobre a importância dos royalties de energia hidroelétrica, hoje entrevistaremos Luiz Rubens Ferreira de Alcântara Bonfim. Escritor, historiador, economista e empresário do setor gráfico pauloafonsino, ele foi assessor de planejamento e secretário de desenvolvimento econômico da Prefeitura de Paulo Afonso, no governo de José Ivaldo, e participou ativamente da campanha pela conquista dos royalties de energia hidrelétrica.


P- Como foi a campanha pela conquista dos royalties?

Luiz Rubens: O movimento foi uma luta justa, que visou compensar Paulo Afonso e todos os municípios produtores de energia hidrelétrica, que cederam parte de seus territórios para a implantação de barragens e usinas, que perderam suas melhores terras para a agricultura e que tiveram que arcar com a responsabilidade de receber milhares de pessoas que vieram para as obras, de garantir os serviços públicos para essa enorme população. Isso sem ter recursos, já que a prefeitura não arrecadava impostos e taxas provenientes dessa sua principal atividade econômica, a produção de energia.

A Assembléia Nacional Constituinte foi eleita em 1986 e instalada no ano seguinte para elaborar uma nova Constituição para o Brasil, coroando o processo de redemocratização. O prefeito Zé Ivaldo aproveitou a oportunidade para propor a inserção da obrigação do pagamento de royalties por parte das empresas produtoras de energia hidrelétrica. A idéia era a de apresentar uma emenda popular, apoiada pela população. Para isso, ele e sua equipe de governo, eu inclusive, organizaram uma campanha de coleta de assinaturas em Paulo Afonso e nas cidades da região que também tinham barragens e usinas. Mas a Chesf boicotou o movimento, prejudicando a coleta de assinaturas. O jeito foi convencer o deputado Fernando Santana a apresentar a emenda em seu nome, juntando o abaixo-assinado em apoio. O Fernando apresentou a emenda e ela foi aprovada.

P- Como foi esse boicote da empresa?

Houve muita pressão por parte da CHESF para que as pessoas não assinassem. Aqui e em toda a região. Espalharam boatos, dizendo que os cidadãos é que seriam penalizados, eles é que iriam pagar os royalties, iam pagar luz, iam pagar água, iam pagar saneamento, etc. A Chesf foi muito autoritária, antidemocrática. E isso foi uma mancha na história da empresa. Eu me lembro que, na época, como secretário municipal, certa vez fui à Chesf solicitar um apoio, insignificante até, para um pequeno empresário que pretendia se instalar na cidade. Chegando lá o gerente que me atendeu perguntou se era para Zé Ivaldo e afirmou com arrogância: “Zero é o que a Chesf tem para Zé Ivaldo!”. Ele respondeu assim para rebater o mote da campanha dos royalties, que era: Zero! É o que a Chesf paga a Paulo Afonso. Era assim que a Chesf tratava a prefeitura municipal.


P- Você sabe informar se antes da promulgação da Constituição Federal de 1988 a CHESF pagava algum imposto, taxa ou contribuição ao município?

Luiz Rubens: Não! Pelo contrário. Não pagava absolutamente nada. A cidade de Paulo Afonso tinha uma divisão física, um muro, e uma divisão econômica, uma parte pobre e outra rica. Existiam duas cidades praticamente, tanto fisicamente como também financeiramente. No lado da CHESF havia uma “prefeitura”, com bastante recursos, tinha saneamento, ruas pavimentadas, tinha serviço de lixo de primeira qualidade, etc. Do lado de cá os recursos eram escassos, tinha dificuldade de limpeza, existia esgoto a céu aberto, a poeira dominava toda a cidade. A Chesf investia no seu acampamento, na sua “cidade”. A outra cidade não recebia nada da empresa. A não ser o lixo da Chesf que era jogado no lixão desta “outra cidade”.


P- Em sua opinião a construção das usinas em Paulo Afonso causou que impactos positivos no município?

Luiz Rubens: A construção destas usinas hidrelétricas causou um grande impacto positivo, não só em Paulo Afonso, mas no nordeste inteiro. Eu lembro que quando chegou a luz lá no meu bairro, em Jaboatão, as pessoas disseram: “agora sim é luz de Paulo Afonso, da cachoeira de Paulo Afonso, é luz boa que não cai, não diminui”. O impacto foi grande na industrialização do Nordeste, na melhoria das condições de vida das cidades nordestinas. E com as obras, Paulo Afonso passou a gerar empregos com uma massa salarial muito boa, atraindo muita gente. E começou a crescer, começou a vender serviços para os funcionários da Chesf, e surgiu a feira livre, as pequenas lojas começaram a surgir, etc. Então Paulo Afonso passou a ter uma dinâmica socioeconômica que terminou por permitir sua emancipação do município de Glória.

P- E quais foram os impactos negativos provocados pelas usinas em Paulo Afonso?

Luiz Rubens: O impacto negativo maior foi o isolamento do acampamento da CHESF com relação ao povoamento que estava se formando fora dos seus limites. Povoamento que se instalava do jeito que era possível, da forma como as pessoas podiam. Fazendo barracos com saco de cimento vazio, da marca Poty, por isso aquela povoação passou a se chamar Vila Poty. Mas a empresa que construía uma obra tão grandiosa, tão importante, com tantos recursos, preferiu se isolar, ignorar aquele povo todo e, o que foi pior, cercar sua área para evitar aqueles “indesejáveis”.

Ter virado as costas para a população que ficou em torno da construção da hidrelétrica foi uma insensibilidade social muito grande dos dirigentes da CHESF da época. Esse tipo de política de construção que a CHESF implantou aqui em Paulo Afonso impôs um grande sacrifício para a população mais humilde, tendo que viver sem a infra-estrutura e os serviços públicos básicos, sem saúde, sem escolas, sem saneamento, ao lado de uma obra monumental.

P- Qual a importância dos royalties das hidrelétricas para os municípios brasileiros afetados por construção desse tipo, mais especificamente pra Paulo Afonso?


Luiz Rubens: Para Paulo Afonso é visível. Desde que a Chesf começou a pagar os royalties, não tem uma única administração que não tenha construído, no mínimo, cem mil metros quadrado de pavimentação e quilômetros de saneamento, além de muitas outras obras. E isso foi feito com dinheiro do recurso dos royalties, que é um recurso para infra-estrutura. Eu acho que quase todo o elemento de despesas da secretaria de obras depende dos royalties da Chesf. Os recursos foram investidos no saneamento, iluminação, pavimentação, grandes obras, praças e no embelezamento da cidade. A cidade hoje tem um aspecto muito diferente do de antigamente, está muito melhor e mais bonita, e supera muitas cidades com população semelhante. Então, por ai você já tem uma idéia de como é importante o recurso dos royalties para o município.

A receita de Paulo Afonso aumentou muito com os royalties, além de uma maior participação em outras receitas como o FPM e ICMS, após a Constituinte, fruto da luta por uma reforma tributária da qual Zé Ivaldo e nós participamos, bem como por diversas políticas públicas implantadas nacionalmente.


P- Os recursos dos royalties têm contribuído para o desenvolvimento econômico, social e ambiental de Paulo Afonso?

Luiz Rubens: Os royalties contribuíram para o desenvolvimento econômico e social do Município, pois são recursos consideráveis que circulam na cidade e ajudam a gerar emprego e renda, já que as obras e serviços em que são aplicados demandam empresas, mão de obra e insumos. Sua utilização em investimentos de obras e infra-estrutura proporciona melhorias na qualidade de vida da população, na medida em que garante energia, iluminação, saneamento, pavimentação, praças e vários outros serviços, equipamentos e instalações públicas. A questão ambiental ainda não foi tratada como deveria ser. Agora é que começou a se fazer o tratamento dos efluentes residenciais. Mas, ainda precisa se fazer muito, como a recuperação das margens do rio.

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