Toda nudez será castigada.

O episódio envolvendo a estudante Geisy Arruda é assustador. Causa indignação e espanto. Como todos tomamos conhecimento, estudantes da Universidade Bandeirantes, de São Bernardo do Campo (SP), agrediram, xingaram, insultaram de todos os modos a colega deles pelo simples fato de ela estar usando uma minissaia. Ou um vestido curto, que importa? Se quisermos ficar na minissaia, cabe até perguntar: a minissaia é uma criação recente?

Surge, me parece, lá pelos anos 60, há coisa de pelo menos 40 anos atrás. Ou mais. Por que o susto desses estudantes? Por que essa reação? Por que a visão de uma mulher com minissaia provoca um frisson como aquele? Jovens se transformam numa turba enfurecida, raivosa, agressiva, numa atitude de quase linchamento.

Atrevo-me a perguntar. Que juventude é esta que se indigna com o corpo de uma mulher? Por que esse corpo feminino a agride tanto? Por que a simples visão de uma mulher bonita de minissaia a excita tanto? Por que, mais que indignação, parece uma turba excitada, e que expõe sua excitação de forma violenta, despropositada, selvagem.

Por esses caminhos, poderíamos revisitar Freud ou Nelson Rodrigues, a depender do olhar. Toda nudez será castigada? E falo nudez num evidente exagero. Ela estava vestida. E faltou pouco para o linchamento.

Que posição tem aquela juventude da Uniban diante do belo? Por que é tomada de tanta raiva diante de uma mulher bonita? Não sei, mas quero dar duas ou três palavras sobre o significado político, cultural e ideológico desse episódio.

Primeiro, cabe dizer que houve uma inversão completa de valores. A vítima transformou-se em ré. Foi jogada às feras. Esteve diante de feras. Foi execrada pela própria Universidade, que só voltou atrás quando sentiu as reações, como as do Ministério Público, do Ministério da Educação e Cultura e da mídia. A vítima é ela. Não pode ser transformada em ré.

Segundo, a agressão feriu os direitos de uma pessoa, a autonomia dela. Não estava usando qualquer roupa inapropriada para a vida universitária. Estivesse ela num convento de freiras, e falamos disso com todo respeito, então ela provavelmente receberia instruções de cobrir todo o corpo, isso na hipótese de pretender ser freira. Não é o caso.

A minissaia, é verdade, encanta a muitos. Pode até suscitar o desejo, vamos ser claros. Nunca foi rotulada como obscena, no entanto. Já faz parte de nossa cultura. Não provoca sentimentos bárbaros, ou, com o episódio da Uniban, devemos dizer que não deveria provocar. A turba jovem da Uniban não resistiu à visão de uma bela mulher insista-se e, então, ela, a bela mulher torna-se vítima da turba, e logo transformada em ré.

Terceiro, esse fato aponta o indício da existência de um perigoso ingrediente naquela juventude: algo que se aproxima do pensamento nazista. Nós não podemos e não devemos nos calar diante de um fato como este. Sob pena da conivência. Calar é como admitir que o ovo da serpente continue a chocar. Não foi um acontecimento qualquer, banal. Leva-nos a recordar a juventude hitlerista.

Quarto, é uma agressão à mulher. Um homem de short, ou com uma bermuda curta, digamos, seria agredido dessa maneira? Eu fico também impressionado com o silêncio feminino e feminista diante do episódio. Diria que ele acende um sinal vermelho para todos nós. Não me lembro de ter visto nada semelhante nas escolas brasileiras, ao menos dos anos 60 para cá. A minissaia sempre foi de uso rotineiro. E não provocava a turma. No máximo, a encantava.

O significado profundamente negativo desse acontecimento, do ponto de vista político, cultural, ideológico, não pode passar em branco. O conservadorismo, o reacionarismo, a natureza retrógrada, a raiva e a discriminação e a intolerância contra a mulher provocam em nós uma indignação profunda. A indiferença diante disso é também uma posição política. O que está em causa é a liberdade, o direito de cada pessoa, a cultura de cada pessoa. Nós todos somos Geisy. Contra a turba enraivecida. Contra a turba cega de ódio. A favor da cultura. Contra a barbárie.

Por Emiliano José.

Um comentário:

Anônimo disse...

O que até agora ninguém mencionou é o histórico da Geisy. Seria ela uma garota ADEGUADA aos padrões de respeitabilidade social. Porque que condenamos a professora toda enfiada e absorvemos a Geisy? Dois pesos e duas medida? Talvez a pornografia tenha chegado a um ponto de saturação em que setores da sociedade começam a reagir. è a lei da física, força de igual intensidade em sentido contrário. Precisamos analisar melhor os fatos! Sabe-se que a universitária em questão estaria negociando com uma revista masculina os direitos de sua imagem por um período extenso até que esta decida de fato tirar o pouco pano que ainda cobre seu corpinho.