A SOCIEDADE CONFIA NO ADVOGADO.

A partir de uma desastrada nota publicada por uma subsecional da OAB na Bahia nos sites da localidade sobre reclamação de um cliente em relação ao advogado que o contratara para demandar ações e reclamar valores, com afirmativa de que o advogado confessara sua falta, como um verdugo a executar a sentença, tive a preocupação de obter informações para saber o juízo de valor que faz a sociedade em relação à figura do advogado, obtendo dados interessantes.
Quando eu mencionei a expressão “desastrada nota” é pelo fato que a Constituição Federal consagra a garantia da presunção da inocência aos acusados penalmente ou administrativamente, ao tempo que estabelece como cláusulas pétreas os princípios do devido processo legal e da ampla defesa, art. 5º, LIV e LV, o que vale dizer, em caso de falta disciplinar de responsabilidade de advogado, somente poderá se afirmar que ele confessou ou se efetivamente cometeu a falta, depois do julgamento pelo Tribunal de Ética e Disciplina da OAB Seccional.  Se qualquer advogado cometer ato reprovável, que responda pelos seus atos disciplinarmente e/ou penalmente e/ou civilmente, se for o caso.
Dados recentes me alegraram de sobremaneira quanto à credibilidade depositada pela sociedade no advogado, como também decisões recentes a amparar as nossas prerrogativas profissionais contra os abusos reiteradamente perpetrados pelas Cortes, Corregedorias, Juízes e até diretores de secretarias. 
O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – CF-DF recentemente encomendou ao instituto Valore Brasil, pesquisa de opinião sobre o grau de confiança da sociedade em relação à própria OAB Federal e nos advogados. No quesito “instituições”, o índice de satisfação dos profissionais com a atuação da entidade é positivo, para 92,36%, entrevistadas 2.136 pessoas entre advogados, estudantes de direito e demais profissionais. Na avaliação da imagem do advogado para a sociedade, foi positivada por de 72,29% dos entrevistados que enxergam positivamente os profissionais da advocacia. Um índice expressivo e que demonstra, segundo conclusões da pesquisa, que o advogado goza de um prestígio fundamental junto à sociedade. A cada 10 pessoas, pelo menos 7 veem com bons olhos o trabalho da advocacia. Ao todo, 67,44% responderam que têm o hábito de consultar um advogado antes de tomar decisões legais.
O prestígio que goza o advogado perante a sociedade brasileira resulta do fato dele no exercício profissional fazer respeitar os direitos e garantias constitucionais dos cidadãos, ao tempo que também faz respeitar suas garantias profissionais com a independência que lhe é exigida. A Constituição Brasileira de 1988 no seu art. 133 diz que “O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”, o que também é repetido na Lei que regulamenta o exercício profissional da advocacia, Lei de nº. 8.906/94, art. 2º. 
Além da garantia constitucional dada e regulamentada para o exercício profissional da advocacia, toda autoridade reconhecida pela sociedade em relação ao advogado reside nos pilares do art. 6º do mesmo EOAB e do art. 2º do Código de Ética do Advogado que dizem que não hierarquia e nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do ministério público, sendo ele defensor do Estado democrático de direito, da cidadania, da moralidade pública, da Justiça e da paz social, subordinando a atividade do seu Ministério Privado à elevada função pública que exerce.”
O EOAB garante ao advogado o direito de comunicar-se reservadamente com seus clientes presos, mesmo sem procuração, art. 7º, III, bem como examinar em qualquer órgão público autos findos ou em andamento, mesmo sem procuração, salvo se o feito estiver tramitando em segredo de justiça, art. 7º, XIII, cuja prerrogativa é também dada para consultar peças de inquérito policial. Por outro lado, é também garantido ao advogado ter vistas de processos judiciais ou administrativos de qualquer natureza, em cartório ou na repartição, ou retirá-los pelos prazos legais, art. 7º, XV, EOAB. 
Algumas Cortes de Justiça, Corregedorias, Juízes e até diretores de secretarias judiciais estão a criar obstáculos às prerrogativas profissionais do advogado, ao não permitir a retirada de autos de cartórios quando não exibido mandato de procuração pelo advogado, com manifesta violação art. 7º, XIII, do EOAB, o que vem se tornando um dilema para o operador do direito.  
Se uma ação tramita em segredo de justiça somente terá acesso aos autos o juiz, os serventuários, as partes e seus advogados e o ministério público, quando for parte ou operar custos legis, como fiscal da lei.  Se o advogado não estiver constituído por qualquer das partes, a ele será vedado acessar aos autos ou deles retirar cópia. Se a ação tramitar sem segredo de justiça, qualquer advogado poderá consultar os autos e retirar cópia, sem a necessidade de exibição de procuração ou de autorização prévia do juiz na chamada “carga rápida”.
A carga rápida se aplica quando o advogado precisar retirar os autos sem procuração ou quando o prazo for comum a advogados diversos numa mesma ação. Em qualquer das hipóteses, para retirada dos autos do cartório ou secretaria a exigência era o advogado deixar retida sua carteira de identificação profissional. Em alguns juízos se exigia até que o advogado fosse acompanhado de serventuário da justiça.  O CNJ em decisão de 07.05.2014, apreciando procedimento de controle administrativo de iniciativa da OAB-PE contra o Provimento 36/2010 da Corregedoria do TJPE, de nº. 005191-02.2013.2.00.0000 proibiu a exigência da retenção da carteira da OAB do advogado que passou a ser facultativo e proibiu a exigência de acompanhamento de serventuário para carga rápida. 
A Corregedoria do TJMG pelos Provimentos n. 195, de 2010, e do n. 232, de 2012, alterou dois artigos do Provimento n. 161, de 2006, no que diz respeito à chamada “carga rápida”, proibindo a saída de autos e determinando que advogados e estagiários usassem escâner ou máquina fotográfica particular para copiarem os autos. “A Ministra Luiza Frischeisen no dia 22.04.2014 concedeu medida liminar para suspender os efeitos dos provimentos, afirmando:” “Não se pode limitar a forma de instrumentalizar a cópia ao advogado, como vem ocorrendo nas dependências do TJMG, ultrapassando a regulamentação possível”, afirma a conselheira Luiza Frischeisen, na liminar, acrescentando que é “natural ao advogado”, conhecer a causa antes de firmar compromisso com o cliente.”
A limitação da “carga rápida” já fora questionada no CNJ por advogados e algumas seccionais da OAB. Em outubro de 2011, por exemplo, o Plenário CNJ julgou procedente o Pedido de Providências 0006688-56.2010.2.00.0000 formulado por um advogado que questionava regra verbal do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo (TJES) de condicionar a cópia dos autos à autorização do desembargador relator do processo. Na ocasião, os conselheiros, em decisão unânime, determinaram que a corte tomasse providências para permitir a cópia dos processos sem segredo de justiça, independentemente de peticionamento pelos advogados.
Noutra decisão o mesmo CNJ deu provimento a recurso interposto pela OAB, Seccional do Espírito Santo, e cassou (25/01) a Portaria nº 000008-1/2009, editada pela juíza federal da 2ª Vara Federal Criminal de Vitória, que violava as prerrogativas profissionais dos advogados. Pela Portaria, para carga rápida era exigido requerimento prévio ao juízo. 
A carga rápida não poder ser vedada ao advogado desprovido de mandato procuratório nos processos que não tramitem em segredo de justiça, bem como não poderá lhe ser exigido autorização prévia de juiz e nem acompanhamento de serventuário junto ao advogado. O requerimento prévio perante juiz somente acontece se tratar de processos arquivados. 
Em tempos recentes tive algumas experiências contornadas. Tramitando processo penal numa Vara Federal e sendo vários os réus e vários advogados, prolatada a sentença, solicitei os autos em carga rápida, recebendo a informação de que poderia ser fornecida cópia da sentença apenas, sem a retirada dos autos. Chamada à diretora da época disse não conhecer a lei que autorizava a carga rápida ao advogado. Requerido ao juiz, este indeferiu a retirada dos autos. Impetrei mandado de segurança perante o TRF1, Proc. 0005492-51.2013.4.01.0000. obtendo liminar e provimento final. Na Secretaria de uma Câmara Cível no TJBA ao solicitar carga rápida de autos de um agravo de instrumento, o diretor disse ali não existir carga rápida, salvo se eu fosse acompanhado de um serventuário. Informei que se tratava de prerrogativa Professional do advogado prevista em lei e somente dali sairia com os autos, desacompanhado de serventuário. Os autos me foram entregues. Eu estava no cartório de uma vara da Comarca de salvador e um jovem advogado solicitou vistas dos autos em carga rápida e o serventuário estava a informar que a juíza baixara portaria proibindo a entrega de autos a advogado sem mandato. Solicitei uma cópia da portaria e disse ao advogado que se sua prerrogativa não fosse respeitada, que solicitasse a presença de representante da OAB-BA e da Corregedoria. Finalmente o jovem, advogado foi atendido.  
Acontecia também do advogado comparecer a agência do INSS para consultar autos ou copiá-los e lhe ser exigido agendamento prévio para atendimento, mesmo correndo prazo para o cliente. Tal prática foi proibida.  Se o advogado na condição de contribuinte comparecer a uma agência para pleitear direito individual ele será atendido como qualquer cidadão, entretanto, se o comparecimento for na condição de procurador de qualquer contribuinte, o acesso a autos independerá de marcação prévia de audiência por meio eletrônico ou não. 
O STF na sessão de 08.04.2014, por decisão da 1ª Turma, manteve acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) que garantira aos advogados atendimento prioritário nas agências do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). “Trata-se de uma alvissareira decisão do STF, constituindo uma indelével conquista da advocacia brasileira”, definiu o presidente nacional da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coêlho. Ele afirmou, ainda, que “a OAB Nacional felicita e aplaude o julgado do STF, que reconhece e declara que o advogado é a voz do cidadão, donde o fortalecimento de um significa a valorização do outro”.
O STF apreciando o mandado de segurança com pedido liminar nº. 26772, impetrado por João José Machado de Carvalho contra decisão do Ministro Raimundo Carreiro do Tribunal de Contas da União que indeferiu a pretensão de “examinar, tomar apontamentos e obter cópias dos autos do Processo nº TC 017.562/2006-5, nas dependências da Secretaria de Controle Externo no Estado de Goiás” em razão da inexistência de procuração a ele outorgada, relator o Min. Gilmar Mendes, deferiu medida liminar para que o impetrante pudesse  examinar, tomar apontamentos e extrair cópias do Processo nº TC 017.562/2006-5, nas dependências da Secretaria de Controle Externo no Estado de Goiás. Da seção notícias do STF na Internet, se sobre a decisão, assim constou: 
“Ausência de procuração e vista dos autos
O art. 7º, XIII, da Lei 8.906/94 (Estatuto dos Advogados) assegura ao advogado o direito de examinar, em qualquer órgão dos Poderes Judiciário e Legislativo, ou da Administração Pública em geral, autos de processos findos ou em andamento, mesmo sem procuração, quando não estejam sujeitos a sigilo, assegurada a obtenção de cópias, podendo tomar apontamentos. Nesse sentido, o Plenário, tendo em conta não se tratar de processo sigiloso, concedeu mandado de segurança impetrado contra decisão do Tribunal de Contas da União - TCU, que indeferira requerimento de vista e cópia integral de processo a advogado, em razão da inexistência de procuração a ele outorgada. Precedente citado: MS 23527 MC/DF (DJU de 4.2.2002).  MS 26772/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 3.2.2011. (MS-26772).” 
O advogado no exercício da profissão deverá fazer valer suas prerrogativas profissionais previstas em lei e agir com a plena observância dos princípios estabelecidos pelo art. 2º do Código de Ética, especialmente, no previsto no inciso II do mesmo artigo citado: “atuar com destemor, independência, honestidade, decoro,veracidade, lealdade, dignidade e boa-fé;”. 
Paulo Afonso, 18 de maio de 2014.
Fernando Montalvão.
Montalvão Advogados Associados. 

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