Membros do
Ministério Público de São Paulo entraram na Justiça contra as ciclovias que
estão sendo construídas pela prefeitura da capital. Dos 400 quilômetros de vias
exclusivas pra bikes previstos até o fim deste ano, 235 já foram concluídos,
mas as obras foram contidas pela iniciativa dos promotores que se arvoraram a
gestores públicos.
Ninguém
entendeu direito a ação dos promotores, até porque nenhuma boa explicação foi
dada à medida por eles tomada. Ao contrário, causou estranheza o fato de
membros do MP intercederem sobre obras de um governo democraticamente eleito pra
cuidar, dentre outras atribuições, da mobilidade urbana na maior cidade do país.
Os argumentos
usados são técnicos, que tratam da funcionalidade e da adequação das novas
vias, que reservam espaço às bicicletas numa cidade abarrotada de automóveis.
Já em fevereiro, uma promotora paulista embargou parte de uma ciclovia por esta
passar diante de uma escola e isso dificultaria, segundo ela, o embarque e
desembarque de alunos em carros particulares.
Em outras
partes do país, inclusive Brasília, por coincidência ou não, têm havido ações
do MP e da Justiça contra a construção de ciclovias. Parece haver uma campanha
orquestrada contra ações que facilitem a mobilidade humana nas cidades, na
contramão da maioria dos países europeus, por exemplo, que vêm dificultando
cada vez mais a presença do automóvel particular no cotidiano das cidades.
As autoridades
francesas e espanholas adotaram esta semana o rodízio de automóveis em Paris e
Madri, assoladas pela poluição. Há muito tempo, porém, cidades como Londres
limitam o acesso de carros aos centros urbanos.
Há décadas
adepta das taxas de estacionamento, a capital britânica adotou agora o pedágio
nas entradas e saídas dos bairros centrais de Londres. Ou seja, usar o
automóvel particular não é proibido, mas fica cada vez mais caro.
É certo que
algumas cidades brasileiras também vêm conseguindo quebrar barreiras. As novas
estradas estaduais de Goiás, por exemplo, são acompanhadas de ciclovias, de
modo que é possível se locomover de bicicleta, com segurança e por longos
percursos, entre cidades.
É claro que há
questões culturais a serem suplantadas. Começa pelo fato de as ciclovias serem
vistas como áreas de lazer e, não, como meios de locomoção pura e simples, no
trajeto casa-trabalho ou qualquer que seja o percurso.
Ademais, o
automóvel é hoje, pra boa parte da nossa sociedade, o símbolo maior de poder, de
riqueza, de prosperidade ou de outros delírios quaisquer. É o mais poderoso
fetiche pequeno-burguês da atualidade.
A chamada nova
classe média brasileira vê algo mágico nessa tralha do automóvel. Muitos, mesmo
em cidades do interior, moram a menos de um quilômetro do trabalho, mas vão de
carro. E os mais aquinhoados às vezes saem da mesma moradia em dois ou três
carros pra percorrerem trajetos semelhantes.
Também é certo
que o transporte público ainda deixa muito a desejar na maioria das cidades
brasileiras. De todo jeito, a abertura de vias exclusivas aos ciclistas deve
ser encarada como um passo importante na luta por maior qualidade de vida. E,
por certo, os membros do MP paulistano terão muito mais o que fazer nas funções
que ocupam.
Por JAIME SAUTCHUK.
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