Eu tinha muitas expectativas pra esse show e, dentro delas,
duas certezas:
1. Roger Waters se posicionaria contra Bolsonaro;
2. Ia dar problema.
Eu preciso começar falando que não tem como esperar
posicionamento diferente do integrante de uma banda com álbuns como The Wall,
Animals e The Final Cut. Quem achou um absurdo o que ele falou, definitivamente
passou a vida toda ouvindo OUTRA banda.
Agora, voltemos ao início. O show começou com fortes
críticas ao Trump e à política antirefugiados que ele defende. Nessa hora o
estádio do Palmeiras concordava em uníssono, urrando palavras de amor ao
baixista do Pink Floyd. Todas as vezes que o Trump apareceu no telão as pessoas
gritaram, estavam achando a crítica excelente.
Eis que Waters encerra o primeiro bloco do show anunciando
um intervalo de 20 minutos, durante os quais foram projetadas diversas frases
no telão com teor político e humanitário (seguem algumas imagens no post). A
expectativa de pessoas que, como eu, ouviram Pink Floyd a vida toda e tinham
total compreensão dos assuntos abordados nos discos, era grande. A qualquer
momento um nome ou uma hashtag apareceria. E apareceu. Na sequência da frase
“RESISTA AO NEO-FASCISMO” apareceu uma tela com exemplos de neofascistas pelo
mundo. Trump apareceu. Putin apareceu. Bolsonaro apareceu.
Nessa hora, a plateia explodiu com diferentes reações. Uns
(eu inclusive) quase perderam a voz de tanto gritar a favor da crítica.
Outros... ah, os outros... os outros que até aquele momento estavam IDOLATRANDO
Roger Waters, passaram a desprezá-lo. Gritos de “ESSE VELHO GAGÁ NÃO SABE O QUE
ELE TÁ FALANDO”, “VAI TOMAR NO CU SEU FILHO DA PUTA”, “EU VOU EMBORA DESSA MERDA”,
“EU QUERO MEU DINHEIRO DE VOLTA”, “QUEM TE PERGUNTOU, SEU MERDA? ”.
Ué... mas você não era O maior fã de Pink Floyd até então?
Você não ouviu TODOS os álbuns? Você não foi em 700 shows? Como que você não
sabia que isso aconteceria? Você realmente achou que Roger NÃO se posicionaria?
“Ah, mas não é da conta dele o que acontece no Brasil. ”
Ué..., mas você não estava achando O MÁXIMO ele criticando o
Trump até agora? Sendo tão fã de Pink Floyd assim você deve saber que a banda é
inglesa e, portanto, o que ocorre nos EUA “também não é da conta dele”.
Vocês acham que parou por aí? Mas é claro que não. Houve um
momento incrível em que o prisma da capa de Dark Side Of The Moon foi projetado
na plateia. Em seguida, no telão, a imensa hashtag: #ELENÃO. Foram quase 5
minutos de gritos favoráveis misturados a vaias. Quando Waters finalmente
conseguiu falar, lembrou a plateia de que ele sempre foi defensor dos Direitos
Humanos (meu, o cara perdeu o avô na Primeira Guerra Mundial e o pai na
Segunda, ALÔ!) e que, portando, jamais seria favorável a um discurso de
exaltação de torturador. Nesse momento ele recebeu vaias. SIM, MEUS CAROS. AS
PESSOAS VAIARAM A DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS NO SHOW DO ROGER
WATERS. Em seguida, lembrou a plateia de que ele é fortemente a favor da
democracia e que estamos passando por eleições importantes e que ele não
gostaria de viver sob o governo de alguém que acha que a Ditadura Militar foi
algo bom (nem eu, Roger... nem eu).
Após muitos e muitos e muitos gritos favoráveis, misturados
a muitas e muitas e muitas vaias, Roger Waters começa a cantar Mother. E esse
foi o momento em que eu entrei em crise.
Pessoas ao meu redor achavam que eu chorava copiosamente
pela música. E, em partes, era mesmo. Mas eu estava chorando majoritariamente
de medo. MEDO. Eu não me senti pessoalmente ameaçada por nenhum pró-Bolsonaro
no show. Mas o que eu presenciei em meio a esse ESPETÁCULO INDESCRITÍVEL me
apavorou. Porque eles querem acabar com a nossa democracia. Com a nossa
liberdade. Eu chorava pela CERTEZA de que eu seria torturada numa ditadura,
pela CERTEZA de que seria EU largada às traças no porão do DOPS. Porque
ditadura não permite a existência de pessoas que se posicionam. E se vocês PELO
MENOS me têm nas redes sociais, vocês sabem que se tem uma coisa que eu faço
nessa vida é me posicionar. E isso jamais seria aceito. Eu chorava por saber
das pessoas ao meu redor cujos rostos eu reconheceria sob os cortes, hematomas
e edemas da tortura no porão do DOPS. Eu chorava porque eu não estou disposta a
abrir mão dos meus direitos e da minha liberdade. Eu DEFINITIVAMENTE não estou
disposta.
Esse show, portanto, foi o mais importante da minha vida.
Porque ele me mostrou a cara da sociedade em que eu estou vivendo. E
principalmente porque ele me mostrou que eu não estarei sozinha na luta. A
metade do estádio que gritou “ELE NÃO” a plenos pulmões estará ao meu lado,
além das 3 pessoas que me abraçaram quando as luzes se acenderam, porque me
viram em prantos e entenderam imediatamente que as lágrimas não mostravam
emoção, mas pavor. Uma moça cuja profissão eu não me lembro e dois moços,
professores de escolas públicas. Eles me lembraram que mataram a Marielle, mas
que o Rio de Janeiro elegeu TRÊS MARIELLES para o Congresso. Eles me lembraram
que Marielle floresceu e que nós também floresceremos.
Finalizo esse texto com a certeza de que existe muita
hipocrisia no eleitorado do Bolsonaro (o cara que mais berrou absurdos estava
fumando maconha... nada de novo sob o sol da incoerência) e que existe muito,
muito, muito ódio no coração do brasileiro. E esse ódio passa longe de ser pelo
PT. É ódio de gente.
Hoje, mais do que nunca, eu grito: ELE NUNCA!
Autor desconhecido.
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