Quando o deputado Domingos Dutra (PT-MA) anunciou que entraria em greve de fome contra a decisão da cúpula nacional do PT, que obrigou opartido a apoiar a reeleição da governadora Roseana Sarney (PMDB) no Maranhão, pouca gente na direção do PT deu importância. “Se depender do PT ele vai morrer de fome”, disse um dirigente.
A situação mudou de figura no último domingo, durante a convenção que oficializou a candidatura de Dilma Rousseff à Presidência, quando chegou ao conhecimento da direção partidária que Manoel da Conceição havia aderido à greve de fome de Dutra. “Isso é sério”, disse o secretário nacional do PT, José Eduardo Cardozo, quando soube da notícia.
Manoel da  Conceição é descrito pela revistaTeoria e Debate, da  Fundação Perseu Abramo, braço intelectual do PT, como “sem dúvida uma  das mais importantes lideranças camponesas do Brasil em todos os  tempos”. Mais velho entre os fundadores do PT ainda vivos, Mané, como é  conhecido, está com 75 anos, tem diabetes, sofreu um acidente vascular  cerebral (AVC) em 2002 que quase o matou e até hoje causa dificuldade na  fala, mas não abalou sua disposição de enfrentar a imposição da direção  partidária ao PT maranhense. “Vou até o final, até ver o resultado. Ou eles  tiram a intervenção no Maranhão ou me expulsam do partido. Senão, eles  vão me ver morto. A última vez que comi foi na quinta-feira”, disse  Conceição, por telefone. Nascido em um  pequeno vilarejo no sertão do Maranhão, expulso das terras da família  por um latifundiário corrupto, Conceição já passou por situações muito  piores do que a greve de fome iniciada quinta-feira. À Teoria e  Debate, ele relatou da seguinte forma um massacre de jagunços contra  camponeses que presenciou em 1958 e escapou com vida por milagre: “A  casa era um salão grande de um morador, da família Mesquita. Eles eram  evangélicos da Igreja Batista. Aí entrou um dos jagunços e matou, sem  troca de conversa, cinco pessoas, a bala e punhaladas nos rapazes e em  uma senhora de mais ou menos 75 anos, que gritava na sala: ‘Não mate  meus filhos!!’ Só que já tinha três rapazes mortos no chão. Deram um  tapão na cabeça dela, jogaram a mulher no chão e cravaram nas costas o  punhalão. Ela ficou rodando no chão, esvaindo em sangue. Uma criança de 3  anos, vendo os mortos no chão, corria gritando: ‘Papai, papai...’ Um dos  jagunços pegou essa criança e deu uma estucada numa parede de taipa que  a cabeça lascou, os miolos se espatifaram no salão”. Enfrentamento. O histórico de  enfrentamentos contra a família Sarney remonta à década de 60. Em 1965,  seduzido pelas promessas de reforma agrária do então jovem líder  progressista José Sarney, Conceição mobilizou os camponeses do interior  maranhense e ajudou a garantir a Sarney a maior votação até então para o  governo do estado. Três anos depois ele foi baleado pela polícia  comandada por Sarney durante uma reunião de líderes camponeses. Passou  mais de uma semana largado em uma cela sem médico nem remédios. A perna baleada  gangrenou e foi amputada em um hospital de São Luís. “Depois o Sarney me  visitou no hospital e tentou me comprar oferecendo emprego para mim e  para minha mulher, uma casa e uma perna mecânica. Em troca queria que eu  trabalhasse para ele. Recusei e fui preso outras nove vezes a mando do  Sarney. É por isso que nunca, em hipótese alguma, aceitarei apoiar a  oligarquia representada pelos Sarney no Maranhão”, disse Conceição, que  no 4º Congresso Nacional do PT, em fevereiro, foi citado nominalmente  pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em seu discurso. A direção petista  até agora não procurou Conceição e Dutra para conversar. O único  interlocutor até agora foi o líder do partido na Câmara, Fernando Ferro  (PT-PE). Dutra é visto internamente como opositor já há algum tempo.  “Esta greve de fome é uma violência contra o PT”, disse um parlamentar  de alta patente. A dupla de grevistas conta com assistência médica da Câmara. “Hoje  (segunda-feira) o médico veio me ver três vezes”, disse Conceição.  Apesar disso o temor na direção petista é grande quanto aos estragos que  uma possível imagem de Conceição deixando o plenário da Câmara em uma  maca possam causar à candidatura de Dilma e à imagem do partido.
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