Os Movimentos Sociais de hoje são mais descontínuos. (Rudá Ricci)

Há um forte diferencial entre os movimentos sociais e as mobilizações populares dos anos 1980 e 1990 e os de hoje: a cultura da sua base social. 

Nos anos 1980, havia um feixe cultural que perpassava grande parte das organizações populares do país: a solidariedade entre pobres expressa pela Teologia da Libertação. As organizações mais à esquerda toleravam ou criavam um certo sincretismo político-religioso com esses valores cristãos e engajados, o que transformou grande parte dos recursos discursivos e projetos da Teologia da Libertação numa cultura hegemônica em nosso país. 

Já nos dias atuais, o narcisismo é a tônica, o que dá uma falsa impressão de unidade a partir da foto de uma grande manifestação pública, mas, na verdade, no subterrâneo encontramos uma miríade de grupos e interesses grupais ou pessoais. No campo partidário, o PSOL parece ter sido capturado por esta lógica narcísica, multifacetada em grupos de interesses que não conseguem expressar uma lógica ou proposta universal. 

Na prática, uma enorme mobilização - ou greve geral - nos anos 1980 e 1990 criava um acúmulo de forças que catapultava suas lideranças para o cenário político nacional. Hoje, uma enorme mobilização ou greve geral parece se consumir no próprio dia do evento. No momento seguinte, suas lideranças são arrastadas para as demandas agressivas de sua base social. Tais lideranças não são liberadas para jogar o jogo nacional, obrigando-se a fazer um movimento sanfona: num dia, uma luta nacional; nos outros, articulação de lutas com sua base. A descontinuidade parece uma sina previsível. 

O narcisismo da base social ativista dos dias de hoje impele que as bandeiras das mobilizações sejam - para unificarem o mosaico de demandas grupais - defensivas (Fora Temer, Contra Reformas e até mesmo Diretas Já, uma expressão geral que não é acompanhada de real movimentação para sua realização). Qualquer proposta mais ofensiva já racharia a unidade de ação. 

Enfim, a base social ativista de hoje é corporativa, autorreferente e pouco solidária. Este é um impasse e tanto que faz do futuro um cenário favorável às lideranças demagógicas que afirmam ser oprimidas e que, por este motivo, se lançam ao centro da arena para disputar com os leões e tubarões da política.

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