INVESTIGAÇÃO SOBRE CIDADÃOS ACIMA DE QUALQUER SUSPEITA. (Fernando Montalvão)

 “Investigação sobre um cidadão acima de qualquer suspeita”. Só os mais velhos e vocacionados para o cinema-político deverão lembrar. É título versão de um filme italiano dirigido por Elio Petri que estreou em escala comercial no ano 1970. No filme, um inspetor do alto escalão da polícia italiana com reputação ilibada, fama de incorruptível, mas reacionário, mata sua amante, Augusta Terzi e procura induzir a polícia italiana de sua autoria e todos os indícios por ele induzidos são afastados pela própria polícia por entender ser ele um cidadão acima de qualquer suspeita.
A expressão Investigação sobre cidadão acima de qualquer suspeita é usada como linguagem satírica sobre o que se apresenta mais não é, como aquele xampu que por décadas foi propagado na TV com o parece mais não é, o que vale dizer, a pessoa se apresenta como uma coisa quando na verdade é outra. Particularmente não chego a tal extremo sobre fatos recentes do judiciário baiano.    
No início da tarde de hoje ao acessar a Internet e abrir a página da barricada da cidadania jeremoabense, o blog dedemontalvao, odiado tenazmente pelos corruptos e inescrupulosos com a coisa pública, para tomar conhecimento dos desdobramentos da rejeição das contas de Tista de Deda e Pedrinho de João Ferreira, pelo TCM-BA, fui remetido à matéria veiculada por Samuel Celestino, sob o título “Tribunal de Justiça chega ao fundo do poço” dando conta do afastamento de dois desembargadores do TJBA, o atual presidente e a ex-presidente, pelo CNJ.
Na manhã de hoje, 05.11.2013, o Conselho Nacional de Justiça –CNJ- afastou das suas funções o presidente do Tribunal de Justiça da Bahia, Des. Mario Hirs, e a ex-presidente Desª.  Telma Brito, resultado que traz desconforto não somente para o Judiciário da Bahia, como também para toda a comunidade jurídica baiana. A decisão foi de 11 X 4 votos.
O CNJ também determinou a abertura de processo administrativo disciplinar – PAD - para apurar a acusação de pagamento de precatórios na gestão atual e da desembargadora Telma Brito. O fato teria gerado prejuízo estimado de R$ 448 milhões. Em um dos casos, o acréscimo no valor de um precatório foi de R$ 176 milhões, outro de R$ 190 milhões. O que surpreende agora é que a decisão do CNJ que ao determinar a instauração de Processo Administrativo Disciplinar – PAD –, determinou o afastamento dos desembargadores dos seus respectivos cargos, especialmente, o Des. Mario Hirs, atual presidente da Corte Estadual de Justiça. A justificativa para os afastamentos se deveu:
“Em relação ao desembargador Mário Hirs, impõem-se o afastamento porque encarna a representação do Poder Judiciário da Bahia e também está investido dos deveres de gestão e da condição de ordenador de despesa. A desembargadora Telma Britto [ex-presidente] deve ser afastada cautelarmente da jurisdição para que a dignidade da prestação jurisdicional seja preservada e a instrução processual ocorra fluidamente”, afirmou o corregedor.
Com o afastamento, os desembargadores continuarão  percebendo seus vencimento, ficando vedados de frequentar o TJBA e usar veículos da Corte, entre outras mordomias. 
Nos jornais televisivos da Globo, Jornal Nacional, e da Bandeirantes, Jornal da Band, os afastamentos dos magistrados foram manchetes e tudo isso não repercute bem.
Não se tratou agora da punição de magistrado interiorano do nordeste, extremo sul, oeste ou do litoral. O CNJ bateu na cúpula do Judiciário Estadual.  
No ano de 2012 um desembargador do TJBA foi jogado na compulsória por supostos desvios de conduta. Agora são um ex e o atual presidente da Corte, alcançados.  Muito recentemente, um advogado indicado pra compor o TJBA teve o nome sufragado pelo Tribunal e nomeado pelo Governador e foi impedido de tomar posse pelo CNJ, cuja decisão foi suspensa pelo STF que garantiu a posse do colega advogado.
Não me atrevo fazer juízo de valor sobre a conduta dos desembargadores afastados. O que não se pode negar é que o TJBA ficou sob suspeita.  
A Desª. Telma Brito, embora eu esteja sempre no Tribunal acompanhando ações originárias ou recursos de meus clientes, nunca estive com ela quando desembargadora. Conheci ainda criança em Jeremoabo quando o pai dela, Dr. Cícero Britto, era ali Juiz de Direito na Comarca e posteriormente foi Desembargador do Tribunal. O seu irmão Aliomar Silva Brito, de minha geração, é também desembargador do TJBA e tem ela mais irmãos na magistratura. Com o afastamento dela creio que os serventuários estão delirando. Segundo os barnabés do judiciário, ela os perseguia.  
O Des. Alberto Hirs não me lembro de ter mantido algum contato com ele no exercício profissional. Pessoas a ele aproximadas dão o maior conceito. Em relação a ambos, em visitas diversas, o CNJ questionou sobre processos licitatórios e irregularidades no pagamento de precatórios. Quanto aos precatórios, creio que possa haver erros de procedimento. Alguns juízes que trabalham no setor são de reputação ilibada. 
Quanto às licitações, diariamente tomamos conhecimentos de escândalos em procedimentos licitatórios nas Prefeituras e na Esplanada de Brasília. No judiciário nada se ouve, seja em Brasília-DF ou nos Estados. Creio que deveria se fazer uma varredura nos dez últimos anos em todos os judiciários.  No Brasil é o que não falta é justiça. É justiça para todos os gostos e as instalações geralmente são suntuosas. Em salvador foi construído de péssimo gosto o Sukitão, sede do TJBA. 
Pela magnitude do terremoto imposto pelo CNJ ao Judiciário da Bahia as consequências poderão ser imprevisíveis.  Se a imagem não era boa piorou.  Antes um desembargador caiu na compulsória. Antes deste, houve tremores envolvendo nomes de desembargadores respeitáveis cujas investigações não foram aprofundadas. Agora a batida é na cúpula.  
Dir-se-á que no Brasil temos 03 justiças. A boa, a má, e a justiça baiana. Outra premissa a percorrer os corredores das Cortes Superiores em Brasília-DF é que em matéria de direito “qualquer besteira jurídica a Bahia já tem precedente”. Recentemente um cliente sofreu um desses terríveis precedentes da Corte e a matéria já em tramita em Brasília.
O Judiciário da Bahia padeceu sob a batuta do vice-rey ACM que ali mandava e desmandava e nomeava os seus. Era um Corte extremamente servil e subserviente, uma redundância. Uma justiça desqualificada moralmente, ressalvados os bons juízes que exerciam a magistratura por vocação e com baixos vencimentos.
Mesma cessada a influência de ACM, imposta aparentemente uma nova ordem, pouco mudou.
O Judiciário baiano enfeitado por corregedorias de toda ordem, da capital, interior, sempre foi incapaz de controlar a própria máquina, corrigir os erros de forma antecipada, agilizar os serviços e controlar o pessoal. Os servidores continuaram com baixos vencimentos e o processo de modernização vai a passos de cágado. Há déficit de juízes. A falta de controle sobre os processos e até sobre os magistrados é injustificáveis.  Aqui são comuns os TQQ, juízes com origem em Estados vizinhos que comparecem nas Comarcas dias de 3ª, 4ª e 5ª. Outra faceta é o excesso de correições internas nas Comarcas e autorizadas pela CORGER, repetidas várias vezes em cada ano que diferentemente do que deveria acontecer, tem entravado mais ainda os serviços cartorários.
O que tem faltado é compromisso com a coisa pública.
O CNJ em diversas visitas feitas ao TJBA vinha reclamando que as diretrizes do Conselho não estavam sendo cumpridas. Quando se acenou com a possibilidade de instauração de procedimentos disciplinares contra os desembargadores Mario Hirs e Telma Brito diversos segmentos correram para prestar solidariedade, entre eles, a OAB-BA que deveria exigir a apuração dos fatos, sem deixar de colocar o princípio da presunção de inocência.
A situação atual impõe a todos uma reflexão. Mesmo com as dificuldades temos encontrados no Judiciário da Bahia homens comprometimentos com a coisa pública. Talvez a falta de estrutura do nosso judiciário desestimule os nossos magistrados a um maior comprometimento. Mesmo sabendo como funciona o nosso Judiciário, temos que acreditar e contribuir para o aperfeiçoamento da instituição.
Recentemente, dois recursos em processos patrocinados por nosso escritório, Montalvão Advogados Associados, sem tráfico de influência, mesmo porque não temos, foram julgados em menos de 20 dias por decisão monocrática do Desembargador Relator.  Outros estão levando em entre 120 e 180 dias, o que vale dizer, para melhorar o Judiciário da Bahia é preciso compromisso com a coisa pública. Na Justiça estadual aqui em Paulo Afonso, pelo que sei, já temos 03 juízes titulares e 01 designado ou substituto. Não sei ao certo. Já é um grande avanço
Se a decisão do CNJ vai ser questionada pelos desembargadores afastados no STF e se eles voltarão, eu não sei. Se restar em desfavor deles comprovação de cometimento de infração disciplinar de natureza grave, que se puna. O que se exige é o devido processo legal e que se assegure o amplo direito de defesa, sem perder de vista do princípio da presunção, que todos são inocentes até prova em contrário.  O fato é que na aldeia global a aparição do nome de qualquer pessoa na mídia, relacionado com desvios de conduta já deixa um mácula difícil de ser retirada.
FRASE. Não há tribunais, que bastem, para abrigar o direito, quando o dever se ausenta da consciência dos magistrados." Rui Barbosa.
Paulo Afonso, 05 de novembro de 2013.
Fernando Montalvão.
Montalvão Advogados Associados.

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